John Wayne e a cavalaria norte-americana não passaram por Umuarama, mas nossa história parece filme de mocinhos de Hollywood que não deixavam índios para contá-la. Aqui os massacrados foram os Xetá, tupis-guaranis que viviam em estado pré-histórico de desenvolvimento nesta região, como se ainda estivessem na Idade da Pedra. Com um agrupamento composto por cerca de 300 indivíduos, eram uma pequena nação, praticamente na infância da evolução da humanidade, um elo perdido de grande valia para estudos antropológicos, desprovidos de qualquer malícia.
O contato deles, a partir de 1953, no distrito de Serra dos Dourados, com a colonização promovida pela Companhia Melhoramentos Norte do Paraná, precipitou sua extinção. Desapareceram do mapa como agrupamento social em menos de 10 anos. Em 1960, a nação Xetá já não existia.
A propósito, nos anais da Companhia (tive acesso a um exemplar), onde se relata a construção das primeiras picadas e a fundação de cidades como Londrina, Maringá, Cianorte e Umuarama, com a progressiva eliminação da floresta e tudo que nela existia, há fotografias dos desbravadores, dirigentes e pioneiros, de onças mortas e de perobas gigantescas que foram derrubadas a machado, mas nenhuma referência aos primitivos habitantes da terra.
Todos sabem que a história oficial é contada pelos vencedores. Mas a referida omissão é um ato falho, uma espécie de confissão ao contrário, uma admissão de culpa pelo sumiço dos índios que viviam na região.
ENTERREM MEU CORAÇÃO NA CURVA DO RIO
Os Xetá foram escorraçados, aniquilados, dizimados. As crianças eram apartadas dos pais, doadas a famílias de sitiantes e fazendeiros que invadiam o chão antes pisado pelos pacatos nativos. Os adultos, se não ocorria o pior, eram apreendidos e levados para muito longe, em péssimas condições de acomodação e transporte. Muitos contraíam viroses dos colonos e morriam na viagem, antes de chegar ao destino.
"Enterrem meu coração na curva do rio", livro escrito por Dee Brown, especialista em história norte-americana e publicado pela primeira vez em 1970, mudou o modo do mundo ver a conquista do Velho Oeste e o extermínio dos peles-vermelhas. Na opinião do tradutor Geraldo Galvão Ferraz, a partir dessa obra, os mocinhos não têm mais a pele branca, pelo menos a maioria. Têm nomes que, nos filmes, eram perseguidos por bandos comandados por John Wayne, Henry Fonda ou James Stewart: COCHISE, GERÔNIMO, NUVEM VERMELHA, CAVALO DOIDO, VICTORIO E TOURO SENTADO (sic).
Pela mesma lógica, nesta cidade e em outras da região, os nomes que adornam determinadas ruas, praças e instituições públicas ou particulares, deveriam ser trocados por TSHEKUENWAIO, EIRAKÁN, HÃAN XETÁ, COEN XETÁ, TUCANAMBÁ JOSÉ PARANÁ, TICOEN XETÁ, RONDON XETÁ, TIARA, TIGUÁ, ADIATAUCÃ OU NHATIÉ...
HERAREKÃ HÉTA, A RESERVA DE PAPEL
Desde os primórdios da colonização de Umuarama, em meados da década de 50, as autoridades constituídas e instituídas falavam na medida compensatória da criação de uma reserva territorial para os Xetá.
Passaram-se 60 anos e já temos em Umuarama o Bosque do Índio, com a escultura meio destruída de um representante da referida etnia, além do símbolo oficial do Município ser um personagem de estórias em quadrinhos da dita raça, um curumim Xetá criado e batizado pelo cartunista Marcos Vaz com o nome de Umuaraminha.
Mas ainda não temos a bendita reserva indígena. A última vez que alguém tentou tirar a reserva do papel, cujo projeto envolve a desapropriação de uma fazenda do Grupo Bradesco, com 800 hectares em mata e 1.000 hectares em pastagens, foi uma grita tão grande dos colonos que todos os Xetá mortos se revolveram nas sepulturas, em um cemitério secreto situado em local incerto e não sabido.
A PERGUNTA QUE NÃO QUER CALAR
Rosa Brasil Tiguá, por exemplo, que ainda menininha foi adotada por uma família branca, na cidade de Douradina, já está chegando aos 65 anos de idade e não recebeu compensação alguma pela infância arrancada de sua tribo nem pela aniquilação de seu povo. Nem mesmo lhe restabeleceram a memória dos antepassados, pois, educada em outra cultura, desconhece a própria.
Nossa história não é muito diferente dos faroestes norte-americanos. Afinal, a companhia colonizadora de Umuarama pertencia aos avós do Tio Sam, os ingleses:
Cadê os Xetá que estavam aqui?
A colonização comeu.
Colonos antropófagos!!!
P.S.: Quem disse que índio bom é índio morto? Se a natureza fosse cuidada por eles, certamente estaria muito mais preservada...
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(*) OSNI MIGUEL SANTANA é bacharel em Comunicação Social (P&P) e Direito. Na política, defensor dos princípios, não de instituições nem de personalidades. Mais guerreiro do que diplomata. Quando crescer, quer ser escritor. Tem 61 anos.
http://www.obemdito.com.br/umuarama/osni-miguel-santana-em-mais-uma-polemica-a-ultima-vez-que/254/
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