O Ministério Público Federal (MPF), durante o último Dia D da Saúde Indígena, em 19 de abril, Dia do Índio, escolheu como tema o "Fortalecimento do Controle Social na Saúde Indígena", quando emitiu mais de 120 recomendações relacionadas a questões como transparência, paridade, representatividade e combate ao nepotismo.
Uma das maiores preocupações do MPF foi em relação ao nepotismo, que tem sido denunciado em muitos distritos pelo país. O MPF foi enfático ao recomendar a adoção de práticas visando coibir a contratação de parentes dos membros dos Conselhos Distritais de Saúde (CONDISI's) pelas ONGs conveniadas ou nos Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI's).
Segundo o documento do MPF: "o que se tem observado é que vários conselheiros, especialmente presidentes de CONDISI, têm se valido de cargos, acertos e negociações, em favor pessoal, com prejuízo de suas funções e do bem coletivo, e sendo incompatível o exercício de cargos e funções de confiança, ainda que mediante empresas interpostas, a recomendação visa a evitar que tais situações prejudiquem a eficácia do controle social".
Esta questão está gerando grandes polêmicas na reunião do CONDISI Leste de Roraima, ocorrida na comunidade indígena Tabalascada. Ao serem confrontados com as graves questões de nepotismo que envolvem pessoas ligadas a este CONDISI, alguns dos envolvidos nas irregularidades usaram o argumento de que o nepotismo pertence à cultura indígena, já que todos os indígenas são considerados parentes!
A realidade, em defesa dos autênticos valores da cultura indígena, é exatamente o contrário disto. Entre as grandes virtudes que caracterizam os povos originários deste continente está a reciprocidade, onde todos os bens são divididos igualmente, e a generosidade é a grande marca dos tuxauas e líderes, que atendem inicialmente aos outros antes de buscar a sua parte nos benefícios compartilhados.
Nesta quinta-feira, 5, o novo coordenador do distrito teve uma palavra muito oportuna, esclarecendo que a questão do nepotismo não se refere aos profissionais indígenas das comunidades (como agentes de saúde), onde os laços de parentesco são muito fortes e a contratação de parentes pode ser considerada uma questão normal. O problema acontece nos CONDISI's, onde o 'tráfico de influência' se tornou uma moeda corrente em grande parte dos distritos do país, nestes tempos tenebrosos de aparelhamento político do Estado por diversos governos, em todos os níveis, e que a gestão do Antônio Alves à frente da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) representou muito bem.
Como disse a ministra Carmem Lucia, futura presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), durante o julgamento histórico que decidiu pelo afastamento do deputado Eduardo Cunha da presidência do Câmara Federal, 'privilégio' na etimologia da palavra se refere ao uso da lei em benefício do interesse privado. A cultura indígena é por essência equitativa e comunitária, e visa o bem comum e a igualdade de oportunidades para todos. Nepotismo significa privilégio para algumas famílias em detrimento das outras, o que fomenta a divisão nas comunidades e é considerado crime no Brasil.
Segundo denúncia protocolada por lideranças indígenas no MPF de Roraima, a secretária executiva do CONDISI Leste de Roraima chegou a ter sete familiares em linha direta empregados no distrito, por diferentes convênios e contratos de terceirização. Isto não é nenhuma defesa da cultura indígena, mas certamente contribui para a crise de legitimidade que hoje infelizmente assola a maioria dos conselhos distritais no país.
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