Atuação da Funai em processo de conciliação pode legalizar invasão de terra indígena
Fundação defende conciliação na terra indígena Apyterewa; estudiosos temem efeito dominó no restante do país
Leandro Prazeres
10/01/2021
BRASÍLIA - A Fundação Nacional do Índio (Funai) se manifestou de forma favorável a uma tentativa de conciliação que pode resultar na legalização da permanência de invasores na Terra Indígena Apyterewa, no Oeste do Pará. A posição está em um ofício, ao qual O GLOBO teve acesso, encaminhado ao Supremo Tribunal Federal (STF). Ela contraria estudiosos e a associação indígena que representa uma das etnias que vive no local. O temor é que uma conciliação sirva de base para legalizar invasores em outras áreas. A terra Apyterewa foi a segunda mais desmatada entre 2019 e 2020, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Estima-se que haja pelo menos 1,5 mil invasores na área.
A manifestação da Funai é de outubro do ano passado. É uma resposta a um ofício da Advocacia-Geral da União (AGU), que representa o governo federal em um processo sobre o caso no STF. A AGU ainda não respondeu se a União vai ou não participar da conciliação.
"Entendemos que a via conciliatória deve ser buscada, considerando que é interesse da Funai o deslinde da ação judicial, de forma que temos interesse em participar das tratativas conciliatórias", diz o documento assinado pelo presidente da Funai, Marcelo Xavier, delegado da Polícia Federal que já trabalhou na assessoria de parlamentares ruralistas durante a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Funai, em 2017.
Demarcação
O pedido de conciliação foi feito pela Prefeitura de São Félix do Xingu, em cujos domínios estão parte da terra indígena, que tem 773 mil hectares e onde vivem cerca de 780 índios das etnias Parakanã e Araweté. Desde 2007, a prefeitura tenta anular a demarcação. O argumento é que a União demarcou a terra indígena sem considerar que já havia colonos morando na área.
Documentos produzidos pelo governo e que constam do processo indicam que a região passou a ser alvo de intensa invasão nos anos que se seguiram ao início do processo de demarcação.
À justiça, a prefeitura de São Félix do Xingu defende a conciliação como uma forma de evitar que a União gaste dinheiro com a desintrusão dos não-indígenas. Em dezembro, o governo do Pará também se manifestou favoravelmente à conciliação.
Para o professor de Antropologia Carlos Fausto, do Museu Nacional, a posição da Funai e do governo do Pará não chega a surpreender:
- Uma conciliação neste caso seria trágica e traria consequências para todo o Brasil. A decisão não surpreende porque, na atual gestão, a Funai passou a ser guiada por interesses diferentes. Este não é um posicionamento favorável aos índios. No caso do governo do Pará, ele sempre esteve a favor dos ruralistas e contra os indígenas.
Procurada, a AGU disse que não se manifestaria. A Funai afirmou, por meio de nota, que "a busca da via conciliatória é a forma adequada para composição de todo e qualquer litígio". Já o governo do Pará disse que seu objetivo é "contribuir com o debate" e "levando em consideração a preocupação social com a segurança pública daquela área".
https://oglobo.globo.com/brasil/atuacao-da-funai-em-processo-de-conciliacao-pode-legalizar-invasao-de-terra-indigena-24831716
PIB:Sudeste do Pará
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