Cacique Raoni e governador divergem sobre licenciamento de rodovia no Mato Grosso
O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) esclareceu, depois, que o processo de licenciamento ambiental do asfaltamento da rodovia estadual MT-322 está em fase de "análise técnica"
Rafael Bitencourt
30/01/2025
O Cacique Raoni, liderança indígena reconhecida internacionalmente pela defesa dos povos originários no Brasil, defendeu que o licenciamento ambiental das obras de pavimentação da rodovia estadual MT-322 seja conduzido pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) e Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). A manifestação foi feita por meio do Instituto Raoni que assina nota pública, com a Associação Terra Indígena do Xingu (ATIX), para defender posição sobre o tema.
A divulgação da nota ocorreu após a repercussão da reunião de lideranças indígenas, incluindo o Cacique Raoni, e o governador do Mato Grosso, Mauro Mendes, na semana passada. Na ocasião, a assessoria de comunicação do Estado divulgou foto dos participantes do encontro e declarações do governador, que geraram mal-estar entre os representantes dos povos da região.
Mendes disse que desembarcaria esta semana em Brasília para pedir a "delegação de competência" do licenciamento para os órgãos estaduais e, assim, garantir o início das obras, conforme nota do governo local.
"O Cacique Raoni, bem como qualquer outra liderança, tem todo o direito de pedir providências do governo para resolver os problemas das estradas que dão acesso às suas aldeias. Mas em nenhum momento Raoni pediu para delegar o licenciamento da MT-322 para o governo estadual", reforça o nota do governo do Mato Grosso.
Com o licenciamento realizado no âmbito federal, as lideranças querem assegurar direitos de escuta prévia das comunidades locais e eventuais medidas compensatórias para conter eventuais impactos socioambientais. "Exigimos que o Ibama, a Funai e o Ministério Público não cedam a pressões políticas e garantam o respeito às leis ambientais e aos direitos dos povos indígenas", destacou a nota.
As entidades informam que cerca de 100 quilômetros da MT-322 estão localizados no limite entre as terras indígenas Capoto-Jarina - onde vive Raoni com os povos Kayapó, Yudjá, Tapayuna e Trumai - e Território Indígena do Xingu (TIX) - onde estão outros 16 povos.
As comunidades indígenas da região enfrentam dificuldades com as condições críticas da rodovia, usada para acessar as sedes municipais mais próximas, onde encontram serviços de saúde, entre outros. "O Instituto Raoni e a ATIX não se opõem ao asfaltamento da rodovia, mas não abrem mão do processo legal e da garantia dos direitos dos povos que representamos", registram as entidades, em nota pública.
A rodovia também interliga dois eixos de transportes de grãos no Mato Grosso (BR-163 e BR-158). Na avaliação das lideranças, a pavimentação da estrada irá favorecer os produtores da região, mas facilitará a chegada de atividades ilegais, como desmatamento e garimpo. A expectativa é que as medidas compensatórias também tratem deste tema.
A nota das entidades também critica a alegação de que a "questão ambiental e indígena" é responsável pela demora na liberação do asfaltamento. Alegam que esse é um argumento "mentiroso", que "gera um clima de ódio anti-indígena na região".
Procurada, a Funai não respondeu sobre o assunto até o fechamento deste texto. O Valor apurou junto ao governo do Estado que a ida de Mauro Mendes para Brasília ficou para a próxima semana. A assessoria do governador também não respondeu se comentaria a nota pública das entidades até o fechamento desta matéria.
Ibama
Como efeito do episódio entre Raoni e Mendes, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) esclareceu que o processo de licenciamento ambiental do asfaltamento da rodovia estadual MT-322 "encontra-se em fase de análise técnica e dentro dos prazos legais estabelecidos".
A pavimentação da rodovia, que conecta a região norte de Mato Grosso ao Araguaia, é defendida pelo governo do Mato Grosso, produtores agrícolas da região e as próprias comunidades indígenas locais, que usam a estrada para acessar serviços médicos e mantimentos nas sedes dos municípios mais próximos.
Na semana passada, o governador do Estado, Mauro Mendes, recebeu lideranças indígenas, incluindo o Cacique Raoni, para tratar do projeto. As declarações do governador geraram mal-estar ao defender a "delegação de competência" no processo de licenciamento para órgãos estaduais, o que seria tratado em reunião com Ibama em Brasília.
Questionado pelo Valor sobre a manifestação de Mauro Mendes, o órgão ambiental respondeu que, "até o momento, não foram localizadas, no processo principal ou em seus acessórios, quaisquer manifestações ou solicitações do governador do Mato Grosso, Mauro Mendes".
O Ibama ainda informou que, atualmente, há um "expediente aberto" para a realização de uma reunião com dirigentes da Secretaria de Estado de Meio Ambiente de Mato Grosso (Sema/MT). O objetivo desta agenda é "tratar de um conflito positivo de competência, e questões de caráter técnico" relacionadas à MT-322.
https://valor.globo.com/brasil/noticia/2025/01/30/cacique-raoni-e-governador-divergem-sobre-licenciamento-de-rodovia-no-mato-grosso.ghtml
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