O Globo, O País, p. 13 - 07/07/2006
MP investiga suspeita de estupro de índia de 9 anos que teve bebê em Manaus
Ismael Machado
Por três meses, uma menina índia de 9 anos da tribo apurinã, do Amazonas, brincou com as bonecas que ganhou de funcionários do hospital Moura Tapajós, de Manaus. Sorridente, mas calada, passava horas fingindo estar alimentando a boneca. Na quarta-feira, às 16h33m, após uma gravidez que ameaçou ser de alto risco, ela deu à luz sua primeira filha, uma menina que nasceu pesando pouco mais de dois quilos e medindo 42cm. As duas crianças passam bem.
Mãe está em enfermaria coletiva e bebê, na UTI
A criança-mãe está numa enfermaria, com outras três pacientes, com as quais já fez amizade. A criança-filha está numa UTI, onde deve permanecer de 30 a 45 dias. A menina nasceu, como era esperado pela equipe que acompanhou a gravidez, com peso abaixo do normal e precisa de acompanhamento. A antecipação da cirurgia pegou a todos de surpresa.
- A cesariana seria na sexta-feira. Íamos transferi-la para o Hospital Balbina Mestrinho, que tem mais recursos, mas ela entrou em trabalho de parto e tivemos que agilizar a cirurgia - disse a diretora-clínica do hospital Moura Tapajós, Christiane Marie, que acompanha o caso.
A índia chegou ao hospital dia 30 de março, trazida do município de Manacaparu pela irmã de 19 anos e por uma enfermeira da Casa do Índio, de Manaus. Grávida de seis meses, a menina tremia com 40 graus de febre, ocasionada pela malária e pela pneumonia.
Segundo a médica, ela chegou chorando, nervosa e sem entender direito o que estava acontecendo. Suspeitava-se que ela era surda, mas o que havia era uma espécie de tampão de cera no ouvido, que a impedia de ouvir.
-No hospital, a menina passou a receber cuidados multidisciplinares, com psicólogos, assistentes sociais, pedagogos, fisioterapeutas e pediatras. Além disso, passou a receber carinho. Ela sempre se recusou a falar sobre a gravidez.
Antropólogos vão investigar prática de violação na tribo
O Ministério Público solicitou a antropólogos que investiguem se a prática de violação de mulheres após a primeira menstruação é comum na tribo apurinã ou se ela foi vítima de estupro. Ainda não há conclusão a respeito. A menina se mantém calada quando fala no assunto.
A aldeia em ela morava é pequena, pouco mais de cinco casas, na área de influência do gasoduto Coari-Manaus. A menina nunca perguntou sobre parentes da aldeia. Após se recuperar da anemia, passou a manter uma rotina acompanhada pelos especialistas do hospital, que ia desde um acompanhamento nutricional até fisioterapia.
A menina ganhou um enxoval completo para bebê e algumas bonecas, que, junto com a TV, foram o passatempo nos três meses anteriores ao parto.
Ela acabou tendo uma gravidez quase normal, ainda mais levando em conta as doenças que tinha - diz Christiane.
A médica achava que seria possível esperar mais um pouco para definir a cirurgia, mas o trabalho de parto veio antes do previsto. A menina não tinha passagem pélvica para o parto normal, por isso a cesariana foi feita em caráter de urgência.
O futuro da menina ainda não foi definido. Depois dos 45 dias na enfermaria do hospital, ela deve voltar à aldeia.
- Estamos nos reunindo com várias entidades para decidir qual a melhor decisão a ser tomada - disse o coordenador da Funai Edgar Fernandes.
A menina já pôde ver a filha. Ainda não a tomou nos braços nem deu de mamar. Apenas olhou de longe, através do vidro da UTI. Já tem consciência de que é mãe, mas ainda vai passar por um intenso trabalho com psicólogos do hospital.
- É uma criança que virou mulher, mas ainda nem sabe disso - resume a médica.
O Globo, 07/07/2006, O País, p. 13
PIB:Juruá/Jutaí/Purus
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