Índios tenharim presos são transferidos para reserva em Lábrea (AM)

Amazônia Real (Manaus - AM) - http://www.amazoniareal.com.br - 10/02/2015
Os cinco indígenas da etnia Tenharim presos por acusação de envolvimento na morte de três pessoas no sul do Amazonas foram transferidos da delegacia do município de Lábrea (a 702 quilômetros de Manaus) para uma base da Frente Etnoambiental da Funai (Fundação Nacional do Índio), que fica dentro da terra dos índios Hi-Merimã, considerados isolados.

A Terra Indígena Hi-Merimã faz parte da jurisdição de Lábrea. Da sede do município até a reserva, são cerca de oito horas de viagem de voadeira (pequena embarcação de motor) pelo rio Purus. Não há acesso via terrestre.

A transferência, que ocorreu no final de janeiro último, foi confirmada à agência Amazônia Real nesta terça-feira (10) pela promotora Simone Martins, da Comarca de Humaitá, município que abriga a Terra Indígena Tenharim-Marmelos, local onde ocorreu a morte de três homens não indígenas em 16 de dezembro de 2013.

Segundo a promotora Simone Martins, a audiência de instrução está marcada para acontecer no próximo mês de março. Na audiência, que ainda não tem data e nem local confirmados, o juiz Reyson de Souza e Silva, da 2ª Vara da Comarca de Humaitá, tomará os depoimentos das testemunhas de acusação e defesa e ouvirá os cinco índios presos. Nesta audiência, o juiz poderá ainda determinar novas diligências requeridas pela acusação e defesa e decidir se julgamento será com Júri Popular.

A Amazônia Real apurou que os índios tenharim foram levados para a reserva Hi-Merimã no dia 30 de janeiro. Na base da Funai no território Hi-Merimã os cinco indígenas ficarão sob custódia do órgão indigenista e precisarão seguir normas. Só terão acesso livre ao território indígena com autorização dos servidores da Funai.

A transferência de Gilvan Tenharim, Gilson Tenharim, Domiceno Tenharim, Valdinar Tenharim e Simeão Tenharim da delegacia de Lábrea (onde não há presídio) para a Terra Indígena Hi-Merimã foi autorizada em novembro de 2014 pelo juiz Jéferson Galvão de Melo, que na época respondia pelo caso, pois acumulava a responsabilidade das duas Varas da Comarca de Humaitá.

Jéferson Galvão de Melo acatou pedido feito pela Procuradoria da Funai, que defendeu a transferência com base no Estatuto do Índio, legislação de 1973.

Melo também havia recebido um pedido de liberdade dos cinco indígenas feito pelo advogado do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Adelar Cupsinski, mas ele rejeitou.

Em entrevista dada anteriormente, Jéferson Galvão de Melo disse o seguinte: "Não há ambiente para se soltar. Poderia ocorrer uma desordem generalizada. As famílias dos mortos não têm nenhuma dúvida que foram eles e se soltá-los no atual momento poderia ocorrer manifestação. Mas também não havia a menor condição de mantê-los no lugar (na cadeia em Lábrea) onde estavam. Ali não tem presídio e tinha a questão da segurança. Então decidi pela transferência para outra área. A Funai e a família optaram pela terra dos índios Hi-Merimã. Eles serão entregues à Funai e caberá ao órgão monitorá-los".

Na opinião de Galvão de Melo, devido à grande repercussão do caso, o julgamento deverá ocorrer em Manaus, capital do Amazonas, e não na cidade de Humaitá.

A decisão do juiz recebeu parecer favorável da então promotora de Justiça de Humaitá, Eliana Leite Guedes. Em entrevista concedida em novembro passado, a promotora Socorro Martins afirmou à Amazônia Real que o parecer de Eliana Leite Guedes e a decisão do juiz Jéferson Galvão de Melo foram "técnicos".

"Antes de se posicionar, a promotora Eliana conversou comigo, pediu minha opinião, debatemos o posicionamento e eu fui a favor. O doutor Jéferson ouviu a Funai, ouviu a Procuradoria Federal. Nada foi feito à toa", disse Simone Martins.

A promotora lembrou, na época, que o caso envolvendo os cinco índios tenharim é "muito sério" e que "tudo que tem sido feito com muito cuidado, de forma técnica". Simone disse que se voltassem para a cadeia os indígenas "poderiam ser mortos".

Procurada, a assessoria de imprensa da Funai disse que, por medida de segurança e proteção aos indígenas, o órgão não iria se pronunciar sobre a transferência e nem sobre as medidas adotadas de vigilância.

Os cinco indígenas são acusados de homicídio, sequestro e ocultação de cadáver de Stef Pinheiro, Luciano Freire e Aldeney Salvador. Os três homens desapareceram no dia 16 de dezembro de 2013 na rodovia BR-230 (Transamazônica), no trecho dentro da Terra Indígena Tenharim-Marmelos, que fica no município de Humaitá, no sul do Amazonas, a 591 quilômetros de Manaus. Os indígenas negam serem os autores das mortes dos três homens.

Festa e transferência de chefia na aldeia

Na mesma decisão autorizando a ida dos tenharim para a Terra Hi-Merimã, o juiz acatou o pedido feito pela Funai dando direito a Gilvan Tenharim de ser "empossado" como o novo cacique da aldeia Kampinhu-ú no lugar do pai, Ivan Tenharim, morto em dezembro de 2013. Melo também autorizou Domiceno Tenharim de participar da Festa do Mboatawa, principal celebração dos tenharim, do qual ele era o organizador.

Contudo, a reação das famílias dos três homens mortos provocou uma nova onda de protesto em Humaitá, resultando em ameaças de fechamento da rodovia 230 (Transamazônica) e novas manifestações. O clima tenso da cidade levou autoridades locais a tomar medidas para evitar novos transtornos, além de reforço de segurança policial. Lideranças tenharim também se comprometeram em adiar as duas atividades (posse do cacique e Festa do Mboatawa).

Irisneia Santos Azevedo de Souza, 37 anos, viúva de Stef Pinheiro de Souza, declarou logo após a decisão do juiz, que após tomar conhecimento "não conseguia mais dormir direito".

"Sinto dor de cabeça e estou nervosa e tomando remédios. É um pouco caso com a vida do meu marido, que está enterrado. Voltou na memória aquele sofrimento do período que eles estavam desaparecidos. Deixar os índios acusados sair da cadeia é uma temeridade. Eles vão fugir. E o juiz falou nessa possibilidade. Por que um branco pode ficar na prisão até a sentença e um índio não".

A Amazônia Real tentou várias vezes falar com lideranças indígenas Tenharim pelos números de celular disponíveis e pelo orelhão da aldeia Marmelos para que eles pudessem se manifestar nesta matéria, mas não conseguiu.

Em nota enviada à Amazônia Real, Carlos Evaldo Terrinha, advogado das famílias dos três homens mortos, voltou a criticar a transferência dos índios tenharim. Para ele, a situação dos índios tenharim presos deve ser analisada à luz do Código de Processo Penal e não do Estatuto do Índio. Para ele, os tenharim são "aculturados".

Para Carlos Terrinha, a ida dos cinco tenharim para a reserva Hi-Merimã pode representar uma "rota de fuga".

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PIB:Tapajós/Madeira

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