Blocos exploratórios da 13ª Rodada impactam terras indígenas

Centro de Trabalho Indigenista - CTI - www.trabalhoindigenista.org.br - 29/06/2015
Pelo menos 27 terras já homologadas serão afetadas pelos blocos a serem ofertados em leilão para exploração de petróleo e gás nas bacias do Amazonas e Parnaíba


A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) divulgou, no último dia 12, o pré-edital da 13ª Rodada de Licitações de blocos para exploração e produção de petróleo e gás natural, prevista para acontecer no dia 07 de outubro deste ano. Ao todo, estão sendo ofertados 266 blocos exploratórios, distribuídos em 10 bacias sedimentares: Amazonas, Parnaíba, Potiguar, Recôncavo, Sergipe-Alagoas, Jacuípe, Camamu-Almada, Espírito Santo, Campos e Pelotas. Em terra, é oferecido um total de 182 blocos. Destes, sete estão localizados na bacia do Amazonas e 22 na bacia do Parnaíba, alguns bastante próximos aos limites de Terras Indígenas (TI) e Unidades de Conservação (UC).

Na bacia do Amazonas, os sete blocos oferecidos circundam as áreas de pelo menos 15 TIs, sendo as mais afetadas as TIs Rio Jumas (a 375m de distância do bloco AM-T-131), Trincheira (a 363m do AM-T-132), Gavião (a 364m do AM-T-107 e 2,4km do AM-T-131), Sissaíma (a 174m do AM-T-107), São Pedro (a 616m do AM-T-132) e Miguel/Josefa (a 72m do AM-T-132), todas do povo Mura.

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Já na bacia do Parnaíba, os blocos estão no entorno de 12 TIs. Dos 22 blocos ali ofertados, seis estão localizados em áreas mais críticas, impactando as TIs Krikati (a 516m de distância do bloco PN-T-113), Governador (a 5,3km do PN-T-98) - que se encontra em processo de reestudo de limites -, Geralda Toco Preto (a 974m do PN-T-65) e Kanela Memortumré (a 185m do PN-T-100 e 640m do PN-T-101), todas dos povos Timbira; as TIs Araribóia (a 552m do PN-T-65), Morro Branco (a 575m do PN-T-98), Cana Brava/Guajajara (a 372m do PN-T-100 e 2,3km do PN-T-84), Rodeador (a 874m do PN-T-100), Bacurizinho (a 1km do PN-T-98) e Lagoa Comprida (a 18,8km do PN-T-84), todas do povo Guajajara; e a TI Caru (a 7,2km do PN-T-46), compartilhada pelos povos Guajajara e Awá-Guajá.

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Com o início do processo exploratório, serão sentidas fortes mudanças nas dinâmicas de ocupação e uso do solo nessas regiões, como instalação de infraestrutura, construção de vias de acesso e a intensa movimentação de trabalhadores, veículos e maquinário para realização das atividades de prospecção sísmica. Além disso, essas áreas de extrema importância socioambiental e suas populações sofrerão com a derrubada de mata para abertura de picadas e clareiras, e o consequente afugentamento de animais de caça.

Outros possíveis impactos podem surgir também na fase de produção, como o comprometimento dos recursos hídricos superficiais e subterrâneos, alto índice de emissão de metano e outros gases que provocam o efeito estufa, e a contaminação dos solos por metais pesados e elementos radioativos, com impacto direto na fauna e flora da região.


Histórico de conflitos


Nos últimos anos, a ANP tem direcionado investimentos para o avanço de fronteiras terrestres de exploração de petróleo e gás. Esta agenda tem se somado ao quadro de ameaças aos povos indígenas e à integridade de seus territórios, em alguns casos reavivando experiências prévias de conflito.

Na bacia do Acre-Madre de Dios, recentes prospecções promovidas pela ANP e a oferta de blocos a poucos metros de terras indígenas na 12ª Rodada de Licitações provocaram intensa reação por parte dos povos indígenas do Vale do Javari, que viveram experiências trágicas de conflito durante a atuação da Petrobrás em seus territórios, nas décadas de 1970-80.

"Não queremos repetir a história que a Petrobras cometeu nos anos 70 a 80 na região do Vale do Javari, que destruíram nossas malocas, roças, dinamitaram nossos lagos e igarapés envenenando mananciais, causando morte de vários indígenas, contaminaram nossas aldeias com sarampos e DSTs, acúmulo de lixos na selva do nosso território, danificando a fauna e flora, trouxeram malária para a região", diz a Carta Aberta dos Povos do Vale do Javari Sobre a Ameaça de Projetos Petroleiros no Brasil e no Peru.

Na bacia do Amazonas, o povo Sateré-Mawé também foi impactado pela exploração de petróleo e gás promovida no âmbito de um convênio entre as empresas Petrobrás e Elf-Aquitaine na TI Andirá-Marau, no início década de 1980. Desta vez, dois dos blocos ofertados pela ANP na 13ª Rodada de Licitações (os blocos AM-T-111 e AM-T-87) estão a 2km desta mesma terra indígena.

"Entraram como ladrão pela janela, sem bater na porta e perguntar do dono se podiam entrar. (...) Nós, ninguém quer que tire esse petróleo. A terra é como tudo que tem vida. Se tira o sangue, ela morre", afirmou em 1982 o tuxaua Emílio, liderança do rio Marau, quando do primeiro levantamento sismográfico que visava descobrir lençóis petrolíferos naquela região (depoimento extraído do livro "Sateré-Mawé: os filhos do guaraná"). Essa mesma fragilidade nos processos de consulta de que falava ele persiste ainda hoje.

Ambos casos citados acima constam no capítulo do relatório da Comissão Nacional da Verdade sobre violações de direitos humanos dos povos indígenas. Apesar deste reconhecimento por parte do Estado brasileiro, e dos direitos assegurados aos povos indígenas do país na Constituição Federal de 1988, a agenda de petróleo e gás imposta pelo governo tem sido pautada pela falta de transparência no que diz respeito à sua interface com os povos indígenas.

A delimitação dos blocos pela ANP não é acompanhada de processos de consulta àqueles que serão os principais afetados pelas atividades a serem posteriormente desenvolvidas, indo de encontro a preceitos e normas internacionais das quais o Brasil é signatário, como a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, que versam sobre a necessidade do consentimento livre, prévio e informado antes que sejam adotadas quaisquer medidas que os afetem.

Nesse contexto, o processo licitatório segue correndo. Segundo o cronograma preliminar disponibilizado pela ANP em sua página, será realizada uma audiência pública no Rio de Janeiro no dia 9 de julho, com objetivo de socializar informações sobre o pré-edital e a minuta do contrato de concessão, cujas versões finais serão publicadas no dia 06 de agosto. O leilão está marcado para o dia 7 de outubro e a assinatura dos contratos está prevista para 23 de dezembro. Segundo o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, o governo prevê arrecadar entre 1,5 bilhão e 2 bilhões de reais com a 13ª rodada.

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