Índios sob ameaça

FSP, Editoriais, p. A2 - 14/06/2020
Índios sob ameaça
Coronavírus tende a ter efeito devastador entre indígenas, sob inação do governo

Uma tragédia em potencial se configura com o avanço do novo coronavírus em terras indígenas, associado à inação do governo Jair Bolsonaro e à histórica precariedade de acesso à saúde desses povos.

Trata-se, em primeiro lugar, de uma batalha por números, como tem sido praxe no país durante a pandemia. Compilados no boletim epidemiológico da Secretaria Especial de Saúde Indígena, do Ministério da Saúde, dados oficiais apontam até sexta-feira (12) para 97 mortes por Covid-19 e 2.749 casos confirmados em todo o país.

Entidades indígenas discordam desse quadro. Com base em números coletados diretamente das populações, o Comitê Nacional de Vida e Memória Indígena e as organizações da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil registraram, até quinta (11), 272 óbitos.

As estatísticas oficiais padecem de problemas evidentes como subnotificação por falta de testes -e por não contabilizarem propriamente indígenas fora de terras homologadas, no contexto urbano e em áreas mais afastadas. Urge aperfeiçoar os registros para orientar a condução da política pública.

Tal mapeamento, em parte, já foi feito. Estudo do Instituo Socioambiental e da UFMG propôs em abril um modelo para calcular a vulnerabilidade de povos indígenas ao coronavírus. Concluiu-se que comunidades perto do centro de São Paulo e as de povos ianomâmi em Roraima e no Amazonas são as mais ameaçadas.

Medidas de autoproteção adotadas pelas populações, como barreiras sanitárias, esbarram no avanço do garimpo ilegal e na expansão da fronteira agrícola, impulsionadas pela omissão da política ambiental do governo Bolsonaro.

Outro estudo do ISA e da UFMG mostra um cenário alarmante em especial para os ianomâmi: o entra e sai de garimpeiros em suas terras coloca em risco de infecção por Covid-19 40% da comunidade, ou cerca de 5.600 indígenas.

Além de melhores dados, faz-se necessário fortalecer as estruturas dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas, do Ministério da Saúde, para atendimento específico da doença, bem como o fornecimento de testes e equipamentos adequados para suporte respiratório e a contratação temporária de agentes de saúde qualificados.

Difícil alimentar algum otimismo, porém, tratando-se de um governo que ao mesmo tempo nega a gravidade da pandemia e conduz uma política anti-indigenista.

editoriais@grupofolha.com.br

FSP, 14/06/2020, Editoriais, p. A2

https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2020/06/indios-sob-ameaca.shtml
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