Invasão virtual ameaça três grupos indígenas no estado

O Popular - https://opopular.com.br - 01/10/2023
Relatório do Conselho Indigenista Missionário aponta casos de "invasões virtuais" de terras dos povos avá-canoeiro, tapuia e karajá

Karla Araújo

1 de outubro de 2023 às 22:30Modificado em 02/10/2023, 18:59


Goiás tem três casos de conflitos relativos a direitos de territórios indígenas, ocupados pelos povos avá-canoeiro, tapuia e karajá. No total, são 14 sobreposições de imóveis nestes espaços. O problema foi identificado por meio da análise de dados da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e do Sistema de Informação para a Gestão do Cadastro Ambiental Rural (Sig-car). As informações são do Relatório Violência Contra os Povos Indígenas no Brasil, publicado pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), com dados de 2022.

Em todo o país, são 158 casos de conflitos. Existem estados com número superior ao de Goiás, como Amazonas, que registrou 15, e o Rio Grande do Sul, com 27. O documento é anual e foi divulgado neste ano em meio à discussão sobre o marco temporal para demarcação de terras indígenas, alvo de recente debate no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Congresso Nacional.

Em geral, os casos constatados em Goiás são classificados como "invasões virtuais", por ocorrerem no âmbito do registro eletrônico de propriedades. Apesar disso, as sobreposições são consideradas um tipo de violência, por serem interpretadas como passo inicial para grilagem de terra.

O relatório constatou que, em 2022, o registro de imóveis no CAR seguiu sendo usado e gerando pressão sobre territórios indígenas de todo o país. "Invasores e grileiros usam os cadastros, que são autodeclaratórios, para dar aspecto de legalidade às invasões. Situações parecidas já vinham sendo verificadas em anos anteriores, com registros em TIs (terras indígenas) de Rondônia e do Tocantins, por exemplo", informa o relatório.

Em Goiás, o caso mais grave é dos tapuias, que moram em Carretão I e Carretão II, territórios indígenas localizados nos municípios de Rubiataba e Nova América, no Vale do São Patrício, no Centro do estado. O relatório do Cimi apontou 11 sobreposições de imóveis cadastrados no CAR sobre o território do povo tapuia. O problema foi identificado em 2021. O levantamento de 2022 demonstrou que, apesar de denunciada, a situação ainda persiste.

Membro da regional Goiás-Tocantins do Cimi e responsável por acompanhar os tapuias, Jeovane Gomes Nunes explica que qualquer pessoa, mesmo sem conhecimento técnico, pode fazer o registro de sua propriedade no CAR. Nunes afirma que ainda não é possível dizer se as "invasões virtuais" foram intencionais ou não.

"A gente não identificou invasão física. Só existe em termos virtuais. Então, é um debate se a gente considera uma violência. O processo de grilagem de terra geralmente começa assim, pelo satélite, pela invasão virtual. Depois que a pessoa vai se apropriando", afirma. Como o território dos tapuias é demarcado, os cadastros sobrepostos são considerados inativos.

Nunes explica que as terras do povo tapuia não foram demarcadas de forma contínua e, por isso, são divididas entre Carretão I e II. Além disso, eles reivindicam outra área que fica na mesma região. O processo ainda está tramitando no Judiciário e é acompanhado pelo Cimi. O conselho é ligado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

Outro caso registrado em Goiás foi de sobreposição de uma área do CAR no território dos karajás de Aruanã e de Mato Grosso. Assim como no caso dos tapuias, o problema foi identificado em 2021 e continuava em 2022.

O relatório do Cimi também identificou duas sobreposições de áreas declaradas no cadastro rural sobre terras dos avá-canoeiros. O território está localizado em Colinas do Sul e Minaçu, cidades do Norte de Goiás. A TI foi homologada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em abril deste ano, mas o processo ainda não foi finalizado. Outros cinco territórios localizados nos estados do Acre, Alagoas, Rio Grande do Sul, Ceará e Amazonas também foram homologados na mesma oportunidade.

De acordo com Nunes, a reivindicação de área feita pelos tapuias e a conclusão do processo dos avá-canoeiros podem ser influenciadas diretamente por recentes decisões tomadas pelo STF. No dia 21 de setembro, o Supremo derrubou, por 9 votos a 2, a tese do marco temporal das terras indígenas (argumento de que a demarcação de TIs deveria respeitar a área ocupada pelos indígenas até a publicação da Constituição Federal, em outubro 1988).

Apesar de a decisão ter sido comemorada entre defensores dos povos indígenas, Nunes destaca que algumas regras criadas - como indenização por benfeitorias - podem deixar os processos de demarcação mais burocráticos e demorados.

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PIB:Goiás/Maranhão/Tocantins

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