Consultorias de gestão de negócios para mulheres indígenas estimulam mercado nacional de artesanato

O Globo - https://oglobo.globo.com/ - 22/04/2024
Consultorias de gestão de negócios para mulheres indígenas estimulam mercado nacional de artesanato
O edital da Fundação Amazônia Sustentável (FAS) contemplou cinco organizações em Manaus, Tefé e São Gabriel da Cachoeira, e impactou quase 900 artesãs

Pâmela Dias

22/04/2024

O artesanato é uma das principais fontes de renda das integrantes da Associação das Mulheres Indígenas do Alto Rio Negro (Amiarn), no coração da Amazônia. Mas, longe da rotina do mercado consumidor, essas obreiras da floresta precisam de uma força do mundo dos negócios para inserir seu trabalho na cadeia produtiva. É aí que entra uma conexão importante entre as aldeias e os grandes centros urbanos.

Diferentes parcerias entre povos originários e organizações dedicadas a fortalecer a economia sustentável vêm encurtando a distância entre as pontas desse mercado artesão. Recentemente, a Amiarn foi contemplada no programa Parentas que Fazem, da Fundação Amazônia Sustentável (FAS), o que tornou possível para a associação receber um curso de capacitação de modelo de negócios da cadeia do artesanato.

No início deste mês, consultoras da Tucum Brasil, revendedora de artesanato indígena baseada no Rio, estiveram com integrantes da Amiarn na comunidade de Tabocal, em São Gabriel da Cachoeira, no Amazonas, para fortalecer a autonomia da produção local e ajudar a desatar os nós da complicada logística de levar as "joias" das mulheres do Alto Rio Negro ao público consumidor.

O edital da FAS contemplou cinco organizações em Manaus, Tefé e São Gabriel da Cachoeira, e impactou quase 900 artesãs. Cada grupo recebeu R$ 250 mil para potencializar suas confecções. Com isso, as mais de 50 mulheres da Amiarn, pertencentes aos povos Baré, Tukano, Baniwa e Kubero, receberam aulas de gestão, planejamento de estoque, comunicação nas redes sociais, logística, precificação e venda.

- O artesanato nos dá independência, nos ajuda a cuidar dos parentes e a continuar o nosso legado de preservação ambiental e cultural. O conhecimento é passado de geração em geração, respeitando o momento certo de colheita dos materiais na floresta - explica a presidente da Amiarn, Edzangela Gregório Maquirino.

Através da renda obtida com seus trançados, a entidade criada nos anos 1980 tirou do isolamento mulheres que estavam em Manaus trabalhando como empregadas domésticas, por vezes em regimes análogos à escravidão, sem folgas e até sem salário. Reestabelecidas em suas comunidades de origem, muitas delas, hoje, sustentam suas casas com auxílio do Bolsa Família e com a venda dos seus produtos.

Um estudo realizado pela The Nature Conservancy, em parceria com o Banco Interamericano de Desenvolvimento e a Natura, no Pará, mostrou que a atividade artesanal gerou, em 2019, uma renda de R$ 5,4 bilhões e 224 mil empregos. A projeção é aumentar em mais de 30 vezes o valor até 2040, chegando a R$ 170 bilhões.

No Alto do Rio Negro, a técnica de produzir utensílios e vestimentas trançando palha e ramos com as mãos nasceu da confecção dos artefatos para pesca, roça e trabalhos domésticos com materiais da floresta. Aturás, peneiras, tipitis e linhas de pesca feitas com fibras de tucum (espécie de palmeira), cipó titica e casca de tururi (um tipo de árvore) deram origem a cestos decorativos, redes, móveis e roupas.

Em 2023, a cadeia produtiva de artesanato apoiada pela FAS garantiu faturamento de R$ 273 mil para ribeirinhos e indígenas. Foram mais de 8,6 mil itens vendidos, com ticket médio de R$ 31,64 por peça.

Joias dentro da floresta

Esse tipo de aporte financeiro vem fortalecendo o trabalho de ligar artesãs que vivem nas entranhas da Amazônia ao mercado do atacado e do varejo brasileiro (e até mundial). A Tucum Brasil conecta indígenas com o público consumidor desde 2013. Segundo a indigenista e sócia fundadora da empresa, Amanda Santana, os principais desafios são a logística de transporte e o acesso limitado ao mercado qualificado.

- Tem joias guardadas na floresta, e as pessoas não sabem porque a arte não circula. Quando as mulheres conseguem transporte, muitas vezes vendem por qualquer preço só para não perderem a viagem - explica Amanda, que acaba de inaugurar uma loja da Tucum no Centro do Rio. - Nosso papel, além de proporcionar uma troca de saberes sobre artesanato e mercado, é revender os produtos de forma ética e a preço justo, com retorno significativo para as comunidades.

Hoje, 40 organizações - como cooperativas e associações - viabilizam a venda do artesanato de cerca de 90 povos indígenas na Tucum. Na mesma vertente, a rede Origens Brasil conta com mais de mil produtores cadastrados, 65% indígenas de 77 etnias diferentes.

- O processo se inicia por meio da sensibilização e do engajamento do setor empresarial. Depois, iniciamos as conexões e facilitação das negociações juntamente com instituições de apoio (ONGs) e comunidades nos territórios - conta o gerente da Origens Brasil, Luiz Brasi Filho.

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