Palimiu (TI Yanomami) - A chegada de Davi Kopenawa foi um dos pontos altos das comemorações dos 20 anos da Hutukara Associação Yanomami (HAY), na manhã do dia 8 de novembro, na aldeia Yakeplaopi na região de Palimiu, no rio Uraricoera. O principal líder do povo Yanomami era aguardado por outras lideranças e por xamãs que vieram de diferentes comunidades da terra indígena no bacarrão de lona construído para recepcionar os visitantes. No local, as lideranças pintavam-se e enfeitavam-se com seus adornos para subirem juntos ao malocão. A presença de Davi era símbolo de resistência e inspiração.
O líder e xamã indígena liderou a caminhada, observando a floresta exuberante e o seu povo. No meio do caminho, passaram por debaixo de uma mangueira atingida por tiros de garimpeiros. No malocão, as músicas e danças Yanomami intensificavam-se, com os indígenas trajando seus adornos e vestes completas. As mulheres substituíam algumas peças de roupa pela pintura de urucum e seus acessórios.
A comunidade Yanomami estava em festa. Davi e os convidados dançaram. Os não indígenas, presentes na celebração, tentavam acompanhar a energia - o que não era nada fácil. Os indígenas acordam muito cedo e nos dias de festejos pouco dormem. As crianças que ainda não andavam ficavam encostadas na parede do malocão, sob os olhares atentos dos irmãos mais velhos e dos idosos, que riam com alegria. "Aqui é minha casa", ratificou Davi a uma profissional de enfermagem quando solicitado a apresentar o teste de Covid e fazer um outro para malária.
Davi Kopenawa é um líder singular. Mesmo com poder e influência mundial, mantém a humildade e a acessibilidade, tocando corações com sua essência Yanomami. Admirado por seu povo, Davi valoriza tanto as responsabilidades quanto os gestos simples, como distribuir camisetas e copos na festa, demonstrando naturalidade e conexão com seus parentes. Ele sempre ouvia seu povo atentamente, mesmo já conhecendo os impactos do garimpo em cada região. Para o líder Yanomami, era fundamental que todos se sentissem acolhidos, ouvidos e fizessem parte de algo maior.
Pelos três dias seguintes, Davi participou de reuniões, conversou com os jovens comunicadores e relembrou a importância da união para enfrentar as ameaças externas. Ao ser questionado se o céu vai cair, numa alusão ao livro que escreveu com o antropólogo Bruce Albert, ele respondeu firme: "Não! Ya Temi Xoa!". Em português: eu ainda estou vivo. "O povo Yanomami está vivo!", acrescentou Kopenawa.
Os preparativos da festa
A Amazônia Real foi convidada pela Hutukara Associação Yanomami (HAY), fundada por Davi e hoje dirigida por seu filho, Dário Kopenawa, para participar dos 20 anos da entidade, que ocorreu de 9 a 11 de novembro. Só ela e o portal G1, como veículos de imprensa. Mas a reportagem chegou antes, em 3 de novembro, para ministrar uma oficina de audiovisual a jovens comunicadores indígenas (Ver abaixo).
"Essa festa aqui, de 20 anos da Hutukara, é resistência. Estamos vivos. Vamos continuar lutando", ressaltou Dário, que também chegou antes para finalizar os preparativos do grande encontro.
Ao desembarcar na aldeia Yakeplaopi, a reportagem viu rostos ansiosos de meninos e meninas que aguardavam os aviões com dezenas de lideranças. Alguns esperavam ao lado da pista de pouso, outros sentados nos bancos improvisados de madeira em frente ao posto de saúde e ao alojamento das forças policiais. A prova de que a proteção do território é uma responsabilidade assimilada desde muito cedo é um garotinho, aparentemente de 3 anos, segurando um pequeno arco e flecha.
Os Sanoma (subgrupo dos Yanomami) chegaram no fim da tarde. Eles vieram de barcos das suas comunidades localizadas rio Uraricoera acima. Os convidados foram recebidos com músicas, danças e xibé feito de beiju. No malocão, de aproximadamente 60 metros de diâmetro, feito exclusivamente para a comemoração, as mulheres dançavam de um lado e os homens de outro. O cacique da comunidade Yakeplaopi, Fernando Palimitheli, demonstrava alegria com a recepção. Ele é um líder simpático e bem relacionado com os indígenas e servidores federais.
"É nossa cultura tradicional. Nós estamos aqui para a comemoração dos 20 anos da Hutukara. Nós estamos muito felizes, Yanomami, Sanoma", disse à Amazônia Real, referindo-se à união de diferentes povos que vivem na TIY. As mulheres Sanoma usavam saias, chapéus e outros acessórios de palhas feitos de forma muito criativa e inocente. Para dar mais movimento e cor aos passos de dança em círculos as palhas também ficavam empunhadas nas mãos. Com o avançar das horas, as moças da comunidade serviam mais xibé [bebida indígena feita de farinha e água] para se refrescarem. Foi na maloca de Fernando que os Sanoma se acomodaram.
Nos dias seguintes, antes da grande festa, as mulheres recolhiam a macaxeira logo cedo pela manhã e os homens faziam a farinha. Um casal chamava a atenção. A massa que já havia sido retirada do tipiti e peneira era jogada pela mulher no tacho quente. Ele, por sua vez, mexia a pouca quantidade. Depois de um tempo a mulher peneirava mais massa e jogava no tacho para que o homem mexesse. Do lado, já havia um tonel cheio de farinha amarela, quentinha. "É para a festa!", alertou o homem empolgado. A cerca de 20 metros dali, os jovens caçadores reservavam a carne de caça, moqueada na noite anterior.
Com o passar dos dias, a quantidade de aviões que pousavam em Yakeplaopi só aumentava. Indígenas Yanomami de 18 regiões de Roraima e Amazonas, cerca de 500 no total, chegavam para a comemoração. À noite, eles se encontravam no malocão, iniciavam rituais Hymuu e Wãyãmu. "Eles estão comunicando, em Yanomami, sobre a comunidade do outro", explicou Dário Kopenawa.
Os indígenas se comunicam sobre os problemas de suas regiões dessa forma, em rituais, o que dá ainda mais seriedade ao diálogo que não tem contato visual - um fica sentado e outro de costa para ele; quando estão agachados os corpos até se encostam, mas os olhares não se cruzam. "Eles estão dizendo como está o garimpo nas comunidades deles." Com os corpos pintados, eles usavam flechas, lanças e penas na cabeça e braços.
O ataque a Palimiu
Os Yanomami ainda são obrigados a conviver com as marcas das agressões de garimpeiros ligados a facções criminosas que apavoraram os indígenas quatro anos atrás. Ainda há locais próximos da comunidade que os Yanomami não atravessam mais, pois continuam dominados pelo crime organizado, mesmo com as ações de retirada dos invasores realizadas pelo governo federal desde janeiro de 2022. É o caso da região de Waikás, mais de 30 quilômetros rio Uraricoera acima.
O cacique Fernando Palimitheli mostrou as marcas no telhado de uma antiga casa de madeira, onde antes trabalhavam servidores da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai). Os tiros atingiram também um orelhão desativado e um tronco de uma mangueira. "Quase morreu Yanomami aqui", lembrou o cacique, à reportagem. "Meu cunhado [pegou] raspão de cabeça, quase olho", disse Fernando. "O pajé rezou e sarou." Ele contou ainda que, na correria para fugir dos tiros, duas crianças (de 3 e 4 anos) sumiram. Os corpos foram encontrados em um córrego dois dias depois.
Dário Kopenawa também não escondia, até mesmo diante da reportagem, sua preocupação com os invasores que estão por perto. "Há drones que sobrevoam aqui para verificar se conseguem passar pela barreira", contou. O medo dele e de outras lideranças era que pudesse acontecer algum ataque aéreo.
Em alguns momentos dos dias, os policiais da Força Nacional faziam a segurança e rondas dentro da comunidade e não apenas no ponto de fiscalização. Os profissionais da saúde também se instalaram durante o dia entre as malocas para realizar testes de malária e acompanhar mais de perto o tratamento para que nada estragasse o momento festivo. À noite, depois de guardarem os materiais de trabalho, voltavam para acompanhar de forma curiosa e respeitosa a festa dos indígenas.
Barreira no Uraricoera
Coragem e força são marcas do povo Yanomami. Isso explica o motivo de ainda se manterem de pé diante de tudo que passaram. Uma luta bem representada pelo vermelho, uma das cores favoritas e muito presente no grafismo corporal. O futuro tuxaua da comunidade, Carmélio Palimitheli, filho do cacique Fernando, relembrou de forma heroica que foram os próprios Yanomami que iniciaram a barreira no rio Uraricoera. E foi essa atitude que revoltou os invasores e provocou os ataques. A medida foi necessária, segundo o rapaz, que apesar de jovem exala muita responsabilidade.
"Tentamos fechar nosso rio. Tentamos. Não era corda de aço [como é hoje], era corda, cordinha mesmo, dessa grossura assim", gesticulava com as mãos Carmélio. "O rio era muito sujo, cheio de óleo. Por causa disso a gente não tomava banho, a gente não conseguia mergulhar. Quando a gente tomava banho estragava a cabeça das crianças", lembrou.
Pela manhã, o Uraricoera é usado para banho, escovar os dentes, lavar louças e roupas; a partir do meio-dia para se refrescar; e de noite para higiene pessoal e até para beber água quando a do poço seca. Na comunidade há pelo menos uma meia dúzia de torneiras com água vinda de poços perfurados pela Sesai, a Secretaria Especial de Saúde Indígena, quando o rio estava contaminado pelo garimpo. As bombas injetoras dos poços funcionam por meio de energia de paineis solares. Antes, os Yanomami de Yakeplaopi pegavam água cerca de 3 quilômetros dentro da mata.
Os banhos de rio voltaram como uma quebra de jejum, com ainda mais prazer. De dentro da água do Uraricoera, Peri Palimitheli, tuxaua da comunidade Porapi (região Waputha), relembrou o movimento de barcos, que era intenso. "Agora, esse ano, está melhor. Tem [até] peixe". Mas de repente a conversa foi interrompida. "Aí, ó, avião do garimpeiro!", chamou a atenção para uma aeronave sobrevoando a região.
Dário se junta à conversa enquanto se seca após o banho matinal, às 6h30: "É, está vendo aí?! É avião do garimpeiro. Está muito feio o clima assim [estava nublado, a visibilidade era de no máximo 5 metros], mas eles passam assim", disse o vice-presidente da Hutukara. Os Yanomami denunciam que os garimpeiros sobrevoam com aeronaves agrícolas abaixo do monitoramento da Força Aérea Brasileira. Procurada, a FAB não se posicionou. O Ministério dos Povos Indígenas e a Funai também não comentaram sobre Waikás.
Os 20 anos da HAY
Na manhã de 9 de novembro, os Yanomami adentraram a mata que cercava as malocas. Eles se pintaram e se caracterizaram com plantas e acessórios, alguns especialmente confeccionados para a festa. A apresentação, minutos depois, emocionava. Homens e mulheres, adornados com flechas, folhas de palmeiras e plantas em formato de animais, pessoas e armas, dançavam e interpretavam, alternando entre momentos de alegria, luta e guerra, em uma exibição eufórica da cultura Yanomami. O cacique Fernando Palimitheli explicou que os rituais Hymuu e Wãyãmu homenageavam o povo que morreu e honravam aqueles que continuam a luta.
Após 12 anos, os xamãs Yanomami se reuniram novamente para uma pajelança, buscando o fortalecimento da HAY. Sob os efeitos do pó sagrado yãkoana, os pajés dançavam, cantavam e gesticulavam no idioma deles. O yãkoana é feito da casca de uma árvore alucinógena seca ao sol, depois moída e soprada nas narinas por outro indígena por meio de um tubo, em rituais xamânicos.
Nesse momento, o físico e o espiritual se fundiam. Segundo a cosmologia Yanomami, os xapiri, entidades invisíveis da floresta, descem e ocupam os corpos dos que estão no ritual, conectando-se com os xamãs para proteger e equilibrar o mundo.
"Isso aqui é uma caneta que Omama ensinou para nós tudo e a gente usa isso. Vai longe porque o mundo é grande. Então, xapiri vai", explicou Davi Kopenawa antes do início da pajelança para os visitantes não indígenas entenderem o rito. "Milhares de anos usamos isso aqui. Nós, povo Yanomami, somos diferenciados, isso aqui é nossa caneta", disse sobre o instrumento usado para inalar a yãkoana, em uma analogia de canetas usadas para decisões políticas fora das comunidades, mas que também os impactam.
É difícil descrever em palavras a energia que preenche o local ao longo do ritual. Mas é fácil perceber e sentir que, em alguns momentos, os Yanomami se transformam em bichos, árvores, montanhas e rios, por meio do corpo e da voz. A energia sagrada é imponente e até as crianças e adolescentes que ainda não compreendem mantêm o máximo silêncio e concentração em volta.
Davi Kopenawa ofereceu à reportagem da Amazônia Real o pó yãkoana. Na noite anterior, Kopenawa, a equipe da agência e outros visitantes já haviam experimentado o pó sagrado e dormido lado a lado no malocão. Durante o ritual, a experiência foi diferente: a cabeça parecia mais leve, os sentidos se aguçaram, as formas geométricas se destacavam e o corpo transpirava mais. A pele ficou mais sensível. Os efeitos passaram rapidamente, mas os pajés usavam doses mais fortes e repetidas.
O encontro dos xamãs durou cerca de 7 horas ininterruptas. O ápice foi quando Davi e duas crianças (um menino e uma menina), representando respectivamente o presente e o futuro, foram colocadas ao centro e erguidas. Depois os pajés estenderam as mãos para a bandeira da Hutukara em uma transmissão energética. O ritual xamânico, iniciado pouco mais de 9 horas, se encerrou fora do malocão com a expulsão do que seriam os problemas de dentro do Território Yanomami.
Mulheres participam
Gracimar Mendes Texeira, de 40 anos, Yanomami da comunidade Maturacá, no Amazonas, é filha de um xamã e cunhada de outro, e ainda assim se surpreendeu pela participação das mulheres no ritual. "Eu estou podendo participar, porém lá na comunidade nossa, mulher não pode estar lá presente. Hoje aqui, eu fiquei lá [no alojamento] um pouco pensando nisso. Como vi aqui mulheres, eu vim". Em algumas aldeias, só homens são pajés. Três mulheres estavam na pajelança dos 20 anos da HAY. "Eu vi, eu filmei. Tanto que eu falei: olha, está na hora da gente ter lá também", disse ela.
Os pajés são muito respeitados, e têm uma importância significativa em toda a comunidade. "Do nada a gente fica doente. Então o pajé, o xamã, já vê. Quando é caso de médico, eles já encaminham. Quando veem que é caso de espíritos, eles vão e conseguem, por mais que a pessoa esteja à beira da morte. Se for espírito mau que perseguiu as pessoas, eles vão e conseguem salvar", detalhou Gracimar.
Uma das mulheres pajé é Simone Surucucu. Ela fala pouco o português, mas compreende e responde em poucas palavras a curiosidade: "Mulher pajé, sim!", afirmou. "Eu curo curumim", adiantou sobre suas experiências de cura na região de Surucucu. Em determinado momento, o professor Rogel Seisi Yanomami, da comunidade Nöhipiu (Amazonas), se aproximou com a intenção de ajudar no diálogo como intérprete - ele entendia melhor o português, mas a conversa pouco avançou. Entretanto encerrou com uma frase marcante sobre a posição da mulher na Terra Yanomami: "Eu sou forte!", encerrou Simone.
Depois do ritual, teve ainda uma reunião com Davi Kopenawa e outros xamãs, encerrada por volta de 21 horas. O momento foi para traçar novas ações da Hutukara diante do governo federal. Os pajés Person e Geremias confessaram cansaço após toda a programação, mas ainda assim se dispuseram a mais uma conversa com a Amazônia Real. As frases em Yanomami são sempre maiores quando comparadas ao português. Rogel auxiliou mais uma vez no entendimento. "Eu vi aqui que teve doença, gripe e diarreia, eu afastei. Limpou a floresta, rio!", contou Person Yanomami, referindo-se ao que havia feito durante o ritual xamânico. "Eu limpei daqui sangue derramado nessa maloca e afastei a doença", falou Geremias Yanomami.
A força da Hutukara
Criada em 2004, a Hutukara lidera ações para proteger o território, a saúde, o meio ambiente e a cultura Yanomami. A associação se articula com outras organizações indígenas, promovendo encontros e assembleias para fortalecer a autonomia das comunidades. A Hutukara se inspira na Comissão Pró-Yanomami, liderada nos anos 1970 por Claudia Andujar, Bruce Albert e Carlo Zacquini.
Kristian Bengtson, oficial de programa da embaixada da Noruega no Brasil, esteve na assembleia de criação da HAY e foi convidado para a comemoração dos 20 anos. "Garantir os direitos territoriais dos povos indígenas automaticamente garante uma gestão sustentável desses territórios, da floresta e da biodiversidade e isso vai promover essa luta global contra as mudanças climáticas", explicou o interesse em apoiar as organizações dos povos originários.
Respeito, união e coragem marcam a luta Yanomami. Líderes Kayapó e Ye'kwana participaram da comemoração dos 20 anos da Hutukara. Os dois povos, junto dos Yanomami e Munduruku, formam uma aliança contra o garimpo ilegal. Mydjere Kayapó, relações públicas do Instituto Kabu, parabenizou a HAY. "A Hutukara é um exemplo para nossa associação. Eles têm mais tempo que a nossa. Vim aqui conhecer a cultura dos nossos parentes e é muito forte", avaliou o indígena, em sua primeira vez na TIY.
Presidente da Associação Wanassedume, Júlio Ye'kwana lamentou que há áreas do seu povo, dentro da TIY, que as próprias lideranças não conseguem entrar - é o caso de Waikás. Mas reconhece que já esteve pior. "Eu vim aqui ainda na época do governo (de Jair) Bolsonaro. Rio sujo, eram barcos subindo toda hora, barulho, não sossegava nada, hoje estava tranquilo, escutava até as cigarras", ressaltou, reforçando que esses sons da floresta são importantes para os povos indígenas.
Elayne Maciel, coordenadora da Frente de Proteção Etnoambiental Yanomami e Ye'kwana, participou com outros servidores da Funai do último dia de celebração, 11 de novembro. Eles chegaram no meio da manhã de helicóptero e partiram por volta de 14 horas. A Casa de Governo, criada para gerenciar a crise do garimpo ilegal na TIY com sede em Roraima, enviou somente um fotógrafo.
Segurando o céu
O povo Yanomami segura, firmemente, o céu. Uma responsabilidade sem tamanho e reconhecida mundialmente. Sensível a essa luta ambiental, o cineasta belga Pieter Van Eecke, de 48 anos, acompanhou a luta de Davi Kopenawa e os outros dirigentes da Hutukara pelos países da Europa a partir de 2018, período em que Jair Bolsonaro (PL) era presidente do Brasil e facilitava a invasão garimpeira na TIY. O resultado é o filme Holding Up The Sky (Segurando o Céu, em português).
Exibido para os Yanomami durante a festa de 20 anos da HAY, o filme é uma promessa de Pieter para Davi e Dário. "O combinado, desde o início, era voltar nessas regiões e exibir o filme depois de pronto", disse. O documentário está disponível em duas versões, uma em inglês e outra em yanomae - um dos nove dialetos da TIY. Em 2023, a produção participou da Mostra Internacional de Direitos Humanos, em Genebra. A produção cinematográfica está disponível também no canal Al Jazeera. "A sua mensagem [de Davi] não é só em defesa do seu território, mas do mundo inteiro, por isso quis captar essa luta", contou o cineasta à Amazônia Real.
Outro cineasta, Morzaniel Iramari, também esteve presente. Ele é um pioneiro entre os Yanomami, acumulando importantes reconhecimentos cinematográficos. Em 2023, seu curta-metragem Mãri hi - A Árvore do Sonho foi premiado no Festival de Cinema de Gramado, recebendo os Kikitos de Melhor Fotografia e Prêmio Especial do Júri. No mesmo ano, a obra também foi eleita o Melhor Documentário na Competição Brasileira do prestigiado festival internacional "É Tudo Verdade", referência no cinema documental da América Latina.
"Eu cresci ouvindo falar do Davi, porque nasci ali. Eu não sabia o que ele fazia. Só ouvia as falas: os brancos da cidade são perigosos, não é bom, aí eu quero que alguém de vocês, jovens, daqui a pouco tem que aprender, estudar, falar português para defender nossos direitos Yanomami", relembrou Morzaniel o estímulo do líder xamã para que ele se tornasse um comunicador indígena. "Para mim é muito importante, imagem do povo Yanomami, pintura, isso eu estou defendendo, estou lutando."
Oficina audiovisual
De 4 a 8 de novembro, ministrei uma oficina de videocast para dez comunicadores Yanomami e Ye'kwana. Foram compartilhadas técnicas de produção audiovisual para que eles possam criar conteúdos em vídeo e áudio. Foi apresentado a eles desde a criação de roteiros cativantes até a edição de vídeos no CapCut (aplicativo) para diferentes plataformas. A prática foi o coração da capacitação.
O cacique Fernando Palimitheli e Dário Kopenawa enriqueceram o videocast Urihi Wãa (Voz da Floresta) produzido pelos participantes. Cada um deles desempenhou papeis diferentes no processo. A produção final carregou o propósito de ser um porta-voz da cultura e dos desafios enfrentados pelo povo Yanomami e, do ponto de vista de aprendizado, reforçou o poder da comunicação como uma ferramenta de luta e preservação cultural.
Juruna Yanomami, de 32 anos, vive na Missão Catrimani, e se encantou com a possibilidade de ajudar seu povo por meio de fotos e vídeos. "É importante para quando acontece alguma coisa para registrar e enviar para não indígenas para divulgar as informações corretas", relatou. Para o treinamento, a HAY ofereceu smartphones para cada comunicador com microfones de lapela, além de energia elétrica por meio de placas solares para recarregar os aparelhos e internet. "A gente estava muito preocupado nisso. Vocês, jovens, têm que aprender. Já esperamos muito, quase 20 anos. Se acontecer alguma coisa vocês precisam fotografar e filmar", clamou Dário para os comunicadores indígenas.
Munidos desses ensinamentos básicos, os dez comunicadores atenderam ao chamado e se encarregaram de realizar a cobertura audiovisual da festa.
O jornalista Felipe Medeiros viajou ao território Yanomami a convite da Hutukara.
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