Influencers do garimpo na Amazônia reúnem milhares de seguidores e se gabam de exploração ilegal

FSP - https://www1.folha.uol.com.br/ - 11/02/2025
Influencers do garimpo na Amazônia reúnem milhares de seguidores e se gabam de exploração ilegal
OUTRO LADO: Gabrielly da Silva e Meta, dona do Facebook, não se manifestaram e outros mencionados não foram localizados; MPF e PF investigam plataforma e autores de postagens

José Marques e João Gabriel

11/02/2025

"Já dizia meu vovô, acessório é ouro, carro é Toyota e investimento é garimpo ilegal", diz a postagem de um dos perfis de redes sociais que incentivam a exploração ilegal do ouro na Amazônia, dão dicas de como fugir da fiscalização do governo e até ensinam a produzir azougue (mercúrio líquido).

Páginas pessoais e grupos utilizados por esses usuários se tornaram alvo de uma investigação do Ministério Público Federal no Amazonas que questiona por que a Meta -dona do Facebook e do Instagram- permite que as contas permaneçam ativas.

O inquérito é desdobramento de outra investigação, já existente, da Polícia Federal em Roraima, que apurava suspeitas de crimes contra a ordem econômica por usuários das redes sociais.

Procurada pela Folha por meio da assessoria, a plataforma não se manifestou. A reportagem também procurou uma das citadas nas investigações, Gabrielly da Silva Rodrigues. Ela também não se manifestou. Os outros mencionados nas apurações não foram localizados.

No processo, a Procuradoria também pede explicações à Meta. Ao órgão, a companhia apresenta seus mecanismos de controle e diz ter desativado uma série de perfis apontados pelas autoridades.

Apesar das explicações, os documentos mostram que existiam contas que seguiam no ar, apesar do alegado pela empresa, ainda em janeiro deste ano. Outras já não estão mais acessíveis.

"[Foi identificada] a permanência de diversas publicações relacionadas à apologia e à incitação da garimpagem ilegal na Amazônia. Além disso, certificou-se que permanecem ativas duas publicações que constavam no relatório anteriormente encaminhado pelo MPF ao Facebook", diz o relatório do Ministério Público.

O inquérito civil mostra a atuação de dezenas de perfis ou grupos, que reúnem milhares de seguidores no Instagram e no Facebook e incentivam a prática ilegal.

Um vídeo publicado no grupo "Garimpos da Amazônia" por um usuário que diz ensinar "fórmulas de sucesso" ensina a "produzir e fabricar o seu próprio azougue para a extração de metais preciosos".

"O uso indiscriminado de mercúrio, que é expressamente regulamentado pela Convenção de Minamata, contribui para a contaminação de rios e solos, causando danos irreparáveis ao meio ambiente e colocando em risco a saúde de comunidades indígenas e ribeirinhas", diz um dos documentos do inquérito, assinado pelo procurador da República André Luiz Porreca Ferreira Cunha.

Numa das contas investigadas pela PF, uma usuária identificada como Gabrielly da Silva Rodrigues tem como destaque uma série de posts que ela reuniu sob a legenda de "garimpinho".

Ela aparece em áreas de garimpo com anéis de ouro e em selfies para mostrar as roupas que usa no garimpo ou a pele queimada após um dia de sol -possivelmente, diz a PF, enquanto trabalhava minerando.

"Não era pq eu tava no mato que eu tinha que andar desarrumada", diz, em uma dessas fotos.

Segundo a PF, ela é casada com Gilvan Menezes, que também é investigado por suspeita de praticar garimpo ilegal.

No seu perfil, ele compartilhou o vídeo de um avião pousando no que a PF diz ser a pista de pouso de Homoxi -um dos maiores pontos de extração da Terra Indígena Yanomami, que chegou a ter 16 km de extensão.

"Eita tempos bons só lembranças foi gratificante trabalhar nesse lugar abençoado", diz a legenda da publicação.

No geral, as postagens expõem o dia a dia dos garimpeiros, que atuam sem equipamentos de proteção, e usando escavadeiras, dragas e aviões, inclusive à noite.

Os usuários se gabam mostrando pepitas, potes de ouro e joias, pistas de pouso clandestino e grandes crateras de mineração.

Uma usuária aproveita o grupo "garimpeiros do rio Madeira" para anunciar a venda de uma balsa usada para transportar o maquinário. Ela diz só aceitar pagamento em dinheiro.

Dhiego Gomes tinha, à época dos acesso pelos investigadores, 55,6 mil seguidores no Instagram e fazia vídeos de humor.

"2024 o bonde vai ficar rico caso contrário vai dormir todo mundo na cadeia", diz em um. "Dinheiro e [revólver calibre] 38 a gente só mostra se for usar", escreve em outro.

Também há críticas ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e e aos "zumbis", como são chamados os agentes das operações de fiscalização e repressão do garimpo ilegal.

A página Itaituba Véia -referência à cidade paraense que é um dos maiores polos de garimpo do Brasil-, com 121 mil inscritos, publica vídeos com piadas e inclusive oferece parcerias para divulgação de outras páginas e posts patrocinados.

Procurada, Gabrielly da Silva Rodrigues não se manifestou. A reportagem não conseguiu localizar Gilvan e os outros mencionados nas investigações.

A intenção do Ministério Público Federal com o inquérito é de que, apesar das mudanças recentes de políticas do Facebook, a rede social aprimore mecanismos para conter conteúdo ilegal.

Esse e uma série de outros inquéritos civis relacionados a plataformas de vendas de produtos e de redes sociais ficaram sob a responsabilidade do 2o Ofício da Amazônia Ocidental do MPF.

Uma das possibilidades é que a plataforma impeça essas pessoas de utilizarem os serviços.

No limite, a Procuradoria pode pleitear uma indenização para o Fundo de Defesa dos Direitos Difusos, vinculado ao Ministério da Justiça.

https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2025/02/influencers-do-garimpo-na-amazonia-reunem-milhares-de-seguidores-e-se-gabam-de-exploracao-ilegal.shtml
Garimpo:Amazônia

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