Tenho lido sobre a cultura indígena e visitado aldeias. Em Piraquara, no ano passado, conheci os índios Mbya-guaranis. As conversas com o cacique Marcolino e com os demais foram de valores ímpares. Tenho estimulado a ida dos índios às escolas para a realização de palestras e para a venda dos produtos artesanais. Exemplo disso é o que ocorreu em 2005 e neste ano com os índios caingangues que residem em Curitiba próximo à divisa de São José dos Pinhais-PR e que estiveram no Colégio Estadual Ângela Sandri Teixeira e CEEBJA Ayrton Senna.
Um trabalho especial sobre os índios Mbya-Guaranis é a dissertação de mestrado da antropóloga, jornalista, escritora e professora Zélia Maria Bonamigo. O tema Economia dos Mbya-Guaranis: Troca entre homens e entre deuses e homens na Ilha da Cotinga em Paranaguá-PR, desenvolvido pela pesquisadora, foi apresentado no dia 2 de maio de 2006 na UFPR-Universidade Federal do Paraná. A banca examinadora contou com a presença dos antropólogos Edilene Coffaci de Lima, orientadora da pesquisa, doutora e professora da UFPR, Maria Dorothea Post Darella, doutora e professora da UFSC-Universidade Federal de Santa Catarina e de Marcos da Silva Silveira, doutor e professor da UFPR. Estive presente naquela magna tarde, além de ter lido na íntegra a dissertação. Resumi alguns dos pontos importantes.
Comunidade
Rosalina prepara artesanato.
A comunidade da Ilha da Cotinga é de aproximadamente 35 índios Mbya-guaranis (Mbya significa gente). Os guaranis foram classificados em três grupos conforme as diferenças dialetais: kaiova, nhandéva e mbya. Segundo Hélène Clastres (1978), os mbyas são os que afirmam e tentam com o máximo rigor preservar sua identidade cultural. Eles vivem em diversas aldeias no Paraná, em Santa Catarina, no Rio Grande do Sul, Espírito Santo, São Paulo e Rio de Janeiro.
Os mbya-guaranis, que estão atualmente na Ilha da Cotinga, dizem ter chegado na década de 70 do século passado. O casal Salvador e Zoberata, pais de João da Silva, que depois foi o cacique da aldeia, chegou na Ilha advindo da cidade de Chapecó-SC. O casal estava à procura de um lugar em que eles e seus parentes pudessem viver sossegados, que tivesse sinais de seus ancestrais. Os sinais estariam no silêncio, nos ossos dos ancestrais enterrados sob a igreja ali localizada, no nome de Paranaguá, pois conforme Ladeira, citada por Bonamigo (2006), Paranaguá significa, em Guarani, Iparavãpy que quer dizer onde tudo começou.
Com base nos relatórios de Oliveira, Sunfeld e Caiana (1984), Bonamigo (2006) enfatiza que os índios só comunicaram oficialmente sua estadia na aldeia à Funai em 1984, mas já tinham a assistência da Associação de Crédito e da Assistência Rural do Paraná (Acarpa), que atendia aos pescadores que moravam próximos deles na Ilha da Cotinga. Contavam também com a assistência da Santa Casa de Misericórdia, do Posto de Saúde de Paranaguá e do Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição (Inan). Mas como muitos parentes e amigos de Salvador e Zoberata continuavam a chegar na ilha, a assistência não era suficiente por isso resolveram contatar a Funai.
Cotidiano
Na dissertação, Bonamigo deixa evidente que a aldeia é para os índios sua verdadeira casa. As casas são os locais para dormir, fazer refeições e alguns trabalhos, como o artesanato. Durante o dia eles se visitam, procuram saber se os parentes estão bem e se precisam de alguma coisa.
A pesquisadora observou que os adultos plantam sementes de milho, feijão, melancia, mandioca, limpam as plantações ou as colhem. Eles gostam de se alimentar do milho Guarani que, além de ser doce, é considerado sagrado porque é utilizado na sua cerimônia de batismo para que Deus manifeste, através do pajé, qual é o nome que as crianças devem receber. Eles fazem também o mbojape, bolinho feito de milho ou fubá e água e que pode ser frito ou assado na brasa.
Eles têm um coral e se apresentam, mediante cachê, com suas danças de cunho religioso. São convidados pela Secretaria da Cultura de Paranaguá e pela Seec-Secretaria de Estado da Cultura do Paraná, Escolas, Universidades, entre outros.
Arte e economia
O artesanato dos índios Mbya-Guaranis é muito interessante. Eles trabalham de modo que um complementa o trabalho do outro. Por exemplo: o índio faz a peneira e a índia faz o acabamento.
Eles vendem artesanato para comprar alimentos que não conseguem colher, mas os lojistas não pagam o tanto que merecem. Então eles preferem vender para os turistas na cidade de Paranaguá ou para aqueles que vão visitá-los na Ilha da Cotinga.
Eles deixaram claro para Bonamigo (2006) que hoje existe toda essa dificuldade de colher o que plantam, de pescar ou de caçar porque muitos não-índios derrubaram árvores, mataram pássaros, poluíram as águas. Por isso, eles dizem que os não-índios têm obrigação de ajudá-los com doação de alimentos e roupas. E esse não é nenhum favor, pois os não-índios, de alguma forma, tiraram o que eles encontravam na natureza. É obrigação.
Na aldeia ninguém passa fome se os demais têm alimentos. Eles vivem a economia das trocas ou reciprocidade. Então, se alguém não deu conta de vender o suficiente para compensar o que não pode colher, essa pessoa pode pedir para a outra família ajudar. Mas se a outra família também não tem como ajudar, a primeira família terá que pedir a uma terceira família e assim por diante. Caso todas as famílias estejam em dificuldades, o cacique intervém. Quando essas pessoas conseguirem sair da situação difícil devolverão à família o que pediram.
PIB:Sul
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