Morte 3 vezes maior do que taxa nacional

Diário de Cuibá - 13/08/2007
Entre janeiro e julho, 56% dos 84 óbitos na faixa etária de 0 a 5 anos foram causadas por desnutrição ou doenças desencadeadas pela má alimentação

Apesar da repercussão nacional alcançada há dois anos e da promessa de ações de emergência do governo federal, a fome e as doenças preveníveis continuam a matar crianças da etnia xavante, na região leste de Mato Grosso.

Entre janeiro e julho deste ano, 56% das 84 mortes registradas na faixa etária de 0 a 5 anos tiveram como causa a desnutrição (17 mortes), a insuficiência respiratória (18) e os quadros de infecção generalizada (13).

A taxa de mortalidade infantil no período ficou em 97,5 por mil nascidos vivos. O número é 15% maior do que o registrado em 2006 (84,1), supera em duas vezes a média dos povos indígenas e equivale ao triplo da taxa nacional (ver quadro).

As informações foram repassadas ao Diário pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa), que responde pelo atendimento médico nas 189 aldeias do Distrito Sanitário Especial Xavante (DSEI-Xavante) - que abrange quatro pólos base, em 11 municípios.

Somente no Pólo Base São Marcos, nas proximidades de Primavera do Leste, foram contabilizadas oito mortes de crianças, todas relacionadas à desnutrição (ver matéria).

O total de mortes entre janeiro de 2006 e julho de 2007, sem considerar a causa, é outro dado impressionante. De uma população total estimada em 13 mil índios, sendo 3 mil na faixa entre 0 e 5 anos, foram 184 óbitos.

Em nota encaminhada à reportagem, a Funasa não apresenta razões para a situação. "Os técnicos da área de saúde indígena estão realizando uma investigação em cada caso para analisar o histórico de atendimento e as causas dos óbitos", diz um trecho.

Por telefone, a assessoria de imprensa do órgão mencionou fatores culturais para explicar parte dos indicadores. Segundo este argumento, os índios teriam dificuldade em seguir os tratamentos recomendados e ainda em adotar as práticas recomendadas de alimentação e higiene.

Um profissional de saúde, lotado no pólo base de São Marcos, apontou o alto índice de natalidade e a conduta das mães xavante como fatores principais. "Quando nasce um filho, elas deixam de alimentar o mais velho, mesmo que ele tenha pouco mais de um ano", disse, sem se identificar.

A justificativa é contestada por especialistas. "Essa é a velha prática de colocar a culpa da doença no doente", aponta a médica Jacqueline Fernandes de Cintra Santos, pesquisadora do Instituto de Saúde Coletiva da UFMT e integrante do Núcleo de Saúde Indígena da instituição.

Segundo ela, esta visão decorre da falta de profissionais de saúde capazes de compreender as diferenças culturais e mesmo aprender com elas. "É verdade que os xavantes têm uma forma diferente de lidar com os filhos pequenos, mas isso não impede um trabalho de acompanhamento e complementação".

Para a pesquisadora, os números revelam que as lições da crise de 2005 ainda não foram assimiladas. "Houve avanços, mas a política continua desajustada, faltam profissionais especializados e sistema que deveria dar suporte às populações está deficitário".
PIB:Leste do Mato Grosso

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