FSP, Equilíbrio, p. 10-11 - 04/12/2003
Índios se divertem com elementos da natureza
Projeto pesquisa o universo lúdico das tribos do Xingu e resgata jogos e brinquedos feitos com frutas, madeiras e fibras vegetais
Ana Paula de Oliveira
Da reportagem local
Confirmado: é mesmo puro preconceito atribuir o rótulo de programa de índio para atividades aborrecidas e sem graça. Nas aldeias, curumins e adultos participam de brincadeiras e jogos que, divertidos, foram incorporados pelos brancos, como cama-de-gato, peteca e briga-de-galo. É o que mostra o projeto Jogos Indígenas do Brasil, que pretende investigar e documentar o universo lúdico dos índios.
A idéia surgiu no encontro anual da Sociedade Internacional para Estudo de Jogos de Tabuleiro, do qual participaram os pesquisadores da Origem, loja especializada em resgatar e reproduzir jogos da antiguidade. "Um dos organizadores do evento deu a dica de concentrarmos as pesquisas no Brasil", diz Mônica Hardy Sabino, uma das sócias da empresa.
O projeto, ainda em andamento, envolve uma equipe de mais de dez profissionais, incluindo pesquisadores estrangeiros. O psicólogo Alex de Voogt, professor da Universidade de Leinden (Holanda) e especialista em jogos de tabuleiro, participou da primeira excursão, feita para uma aldeia camaiurá (MT), no mês passado. Acostumado a pesquisar jogos pelo mundo afora, ele foi chamado para mostrar os métodos mais adequados de aproximação com os índios.
Segundo Voogt, não basta perguntar aos índios o que eles jogam. Uma opção é começar a jogar e pedir para alguém da tribo completar a jogada. "Assim temos certeza se aquela pessoa sabe ou não sobre o que estamos falando."
A expedição deve passar por mais cinco aldeias indígenas até janeiro, todas na região do Parque Indígena do Xingu. Os dados obtidos serão analisados pela equipe, com o apoio do especialista em jogos Irving Finkel, do Museu Britânico.
Provavelmente, haverá muito material a ser analisado. Só na tribo dos camaiurás, foram registrados seis brinquedos, seis jogos e quatro brincadeiras, afirma Maurício de Araújo Lima, coordenador do projeto e sócio da Origem (conheça alguns nesta e na página ao lado).
Além da produção de um documentário, o projeto prevê a produção de réplicas dos jogos que serão doadas para museus do Brasil e do mundo e apresentadas no 6o Colóquio Internacional de Jogos de Tabuleiro, que será realizado no ano que vem, na Filadélfia (EUA). Lima diz que escolas públicas também receberão kits com jogos e cartilhas explicativas. As descobertas da equipe podem ser acompanhadas pela internet (www.jogosindigenasdobrasil.com.br).
Brinquedos
Pião (y'ym) Construído com uma vareta de bambu fincado em uma fruta, produz um zumbido ao ser friccionado e lançado.
Arma de pressão (mocauara an-gap) A polpa de pequi funciona como a "bala" da arma, que é feita com um bambu.
Peteca (popok) Segue o mesmo formato do brinquedo tradicional e é feita de palha recheada com folhas de algodão.
Perna-de-pau (my'yta) Montada em casca de embira, onde são fixados dois pedaços de madeira para o apoio dos pés.
Jogos e brincadeiras
Marimbondo (kap) Meninos e meninas se dividem em dois grupos. Elas brincam de casinha, enquanto eles constroem uma casa de marimbondo. Assim que as meninas notam sua existência, tentam destruí-la. Os meninos correm e tentam "picar" as meninas.
Briga-de-galo Na água, duas crianças sobem no ombro de outras duas e tentam se derrubar. A que cair perde.
Brincadeira da perereca (tamara angap) Os homens fazem uma vagina de cera e outra de cabaça e cera. Vão até as malocas para provocar as mulheres, que tentam capturar as vaginas que estão no centro da aldeia. Os homens resistem ao ataque o quanto podem, jogando a vagina de um para o outro. Quando as mulheres conseguem pegá-la, elas a destroem.
Brincadeira do pinto (takwãiara angap) Igual à brincadeira da perereca, com a substituição das vaginas por pênis.
Brincadeira da mandioca Um índio se joga no chão, e os outros deitam por cima dele, formando uma pilha. Quando o primeiro não aguenta mais, ele rola, fazendo todos caírem.
Ywa ywa Exercita a habilidade no arco-e-flecha. Um grupo de crianças lança um aro circular feito de fibra de buriti, enquanto outro grupo tenta atingi-lo com flechas.
U'u Jogo de estratégia na areia. Um dos jogadores enterra um fio de buriti sem deixar que os outros saibam em que lugar ele termina. Para dificultar, ele coloca diversos pedaços de fio em locais diferentes da área do jogo. Em seguida, o jogador move o fio para a frente e para trás, e os outros têm de descobrir onde ele termina.
Cama-de-gato (mojarutap myrytsiowit) Usam fio de buriti para formar figuras ligadas à sua cultura, como morcegos, gaivota, peixes e cobra, entre outros.
FSP, 04/12/2003, Equilíbrio, p. 10-11
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