FSP, Saúde, p. C10 - 09/05/2011
Indígenas vivem epidemia de diabetes
Consumo de alimentos industrializados e sedentarismo aumentam risco da doença entre povos de Mato Grosso
Problema tem maior incidência entre índios do que na população em geral por causa de gene que favorece sobrepeso
RODRIGO VARGAS
DE CUIABÁ
A aproximação com o modo de vida ocidental - que inclui sedentarismo e alimentos industrializados - ampliou entre os índios de Mato Grosso a prevalência de males da vida moderna, como obesidade e diabetes.
A constatação é de médicos pesquisadores da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), que, desde 1965, presta atendimento médico aos índios do parque do Xingu. Há quatro anos, a instituição avalia as condições de saúde dos xavantes, que habitam o leste de Mato Grosso.
A instalação de fazendas e o surgimento de estradas e cidades no entorno das terras indígenas vêm alterando rapidamente o estilo de vida dos índios.
O consumo de alimentos tradicionais (milho, mandioca e abóbora) caiu, assim como a frequência de atividades que exigem esforço físico, como a caça.
"A introdução maciça de alimentos industrializados, associada a mudanças no modo de viver desses povos, provocou o aparecimento de casos de hipertensão arterial e diabetes", diz o médico sanitarista Douglas Rodrigues, do departamento de Medicina Preventiva da Unifesp, que integra o projeto. As comunidades mais isoladas e que mantêm o modo de vida tradicional ainda têm uma condição de saúde mais favorável, diz o médico.
DIABETES
O reflexo dessas mudanças vem sendo analisado entre índios xavantes, em uma parceria da Unifesp com a Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (USP).
A coleta mais recente - feita entre 15 e 24 de abril em duas áreas com quase 4.000 índios - revelou que mais da metade dos maiores de 20 anos têm diabetes ou estão prestes a desenvolver a doença. A prevalência de sobrepeso e obesidade chega a 82% entre os adultos.
O endocrinologista João Paulo Botelho Vieira Filho, um dos coordenadores do estudo, diz que até 1987 havia registro de apenas três índios diabéticos nesses locais. "Estamos diante de uma epidemia", afirma. A mudança nos hábitos não é o único fator de risco. Vieira Filho participou do estudo internacional que descreveu o gene ABCA1 - uma variante que favorece o acúmulo de gordura no organismo e que já foi identificada em populações indígenas do Brasil, dos EUA e do Canadá.
"Essa característica era uma vantagem no modo de vida tradicional, em que não havia alimento garantido e era necessário acumular energia. Em um contexto de sedentarismo e dieta industrializada, o efeito é trágico."
As áreas xavantes já registram casos de catarata, insuficiência renal e amputações decorrentes do diabetes.
O consumo de refrigerantes é alto, assim como o de bolachas recheadas e açúcar - fornecido em cestas básicas pelo governo federal.
"Não estamos falando de casos tratáveis de pneumonia ou tuberculose. São doenças crônicas graves. É preciso uma ação urgente, principalmente para reeducar os mais jovens", diz Vieira Filho.
FSP, 09/05/2011, Saúde, p. C10
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/saude/sd0905201101.htm
PIB:Leste do Mato Grosso
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