Governo anuncia pacote com novas áreas protegidas

ISA - http://www.socioambiental.org - 06/06/2012
Pacote editado no Dia do Meio Ambiente inclui a homologação de sete terras indígenas, a criação de duas unidades de conservação e o lançamento da Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial de Terras Indígenas (PNGATI). Mas ministra do Meio Ambiente informa que a criação de novas áreas será previamente submetida a governos estaduais e municipais

O governo anunciou ontem, no Dia Internacional do Meio Ambiente, a oficialização de quase um milhão de hectares em áreas protegidas. Foram homologadas sete TIs (terras indígenas), num total de 950 mil hectares (veja tabela 1 abaixo).

Entre a criação e a ampliação de UCs (unidades de conservação), as medidas totalizam 45 mil hectares (veja tabela 2 abaixo). Com as ampliações, o Parque Nacional do Descobrimento chega a 22,6 mil hectares; a Floresta Nacional de Araripe-Apodi chega a 39,3 mil hectares; e a Floresta Nacional de Goytacases alcança 1,4 mil hectares.

Apesar dos números expressivos do pacote divulgado ontem, a administração Dilma Rousseff teve até agora desempenho pífio no setor. Em um ano e meio de mandato, apenas 21,6 mil hectares em TIs haviam sido homologados. Nenhuma UC federal havia sido criada - por isso as medidas podem ser consideradas tímidas em relação a essas áreas (leia mais: http://www.socioambiental.org/nsa/detalhe?id=3532).

Era esperada a criação de uma grande UC, em Maués (AM), que, segundo a ministra de Meio Ambiente, Izabella Teixeira, deverá compensar a alteração recente dos limites de sete UCs na Amazônia. Também havia expectativa de ampliação do Parque Nacional de Abrolhos (ES/BA). As duas medidas não foram confirmadas por divergências de governos locais.

A Reserva Extrativista Baixo Rio Branco Jauaperi (RR), cujo processo de criação data de mais de dez anos, continua sem sair do papel, o que ameaça ecossistemas e comunidades locais (saiba mais: http://www.socioambiental.org/nsa/detalhe?id=3349) .

Dilma assinou o decreto que oficializa a PNGATI (Política Nacional de Gestão Ambiental e Territorial em Terras Indígenas), reinvindicação das comunidades indígenas desde o final do governo Lula que tem o objetivo de definir e coordenar as ações das diversas instâncias e órgãos oficiais relacionadas à sustentabilidade dos territórios indígenas.

Foi divulgada também a instalação do Comitê de Gestão Integrada das Ações de Atenção à Saúde e Segurança Alimentar à População Indígena, que será coordenado pela Casa Civil e deverá articular as políticas para a área geridas pela Funai (Fundação Nacional do Índio) e ministérios da Saúde, Desenvolvimento Social e Defesa.

O governo editou ainda um decreto que deverá incluir critérios de sustentabilidade nas compras públicas e enviou ao Congresso mensagem para ratificação do Protocolo de Nagoya, sobre acesso e repartição de benefícios da biodiversidade.

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O anúncio das medidas marcou a escolha do Brasil como sede do Dia Internacional do Meio Ambiente e a transferência oficial para responsabilidade da ONU do Riocentro, onde ocorrerá a Rio+20, a partir do dia 12.

Dilma e Izabella Teixeira repisaram números - alguns já conhecidos - sobre a queda no desmatamento, fontes renováveis na matriz energética nacional, a floresta amazônica ainda de pé e áreas protegidas.

Izabella anunciou a confirmação pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) da taxa de 6,4 mil quilômetros quadrados de desmatamento na Amazônia, entre agosto de 2010 e julho de 2011, o menor índice da história e uma queda de 8% em relação ao período anterior. Segundo a ministra, os dados disponíveis indicam um novo decréscimo no ano que vem.

"A escolha do Brasil como sede da Rio+20 chega no momento em que o país tornou-se um dos que mais preservam sua biodiversidade e mais avançou na agenda do desenvolvimento sustentável", defendeu Dilma.

Os discursos da presidenta e da ministra - e o próprio pacote - são uma tentativa de melhorar a imagem do Brasil, a poucos dias do início da Rio+20, frente às críticas de organizações da sociedade civil e de outros países, que consideram que o governo brasileiro tem uma postura conservadora nas negociações que envolvem a conferência.

O secretário geral da Rio+20, Sha Zukang, estava na solenidade em que as medidas vieram a público, no Palácio do Planalto.

Timidez das medidas

Em entrevista coletiva, questionada sobre a timidez na criação de UCs, Izabella Teixeira deixou clara uma mudança de postura na política ambiental do governo e fez uma crítica indireta às gestões anteriores no MMA (Ministério de Meio Ambiente).

"Não chegamos ao limite da criação de UCs, mas não vamos criá-las como no passado, sem consultar todas as instâncias políticas ou sem verificar se existem conflitos socioambientais estabelecidos", disse.

"Queremos fazer uma gestão mais permanente e não ter que ficar remodelando as áreas já propostas", afirmou. Segundo a ministra, nenhuma das UCs anunciadas ontem apresenta conflitos.

Izabella negou que haverá redução no ritmo de criação de UCs, mas afirmou que várias áreas estão sendo revistas porque, depois de sua oficialização, são identificados conflitos, como a presença de comunidades. A ministra citou governos estaduais e municipais como atores que deverão ser consultados pelo MMA em processos futuros.

Ela disse que muitas áreas existem apenas no papel e que o governo pretende investir agora na sua implantação.

"A esta altura, o governo federal já deveria ter uma avaliação clara sobre as áreas mais representativas de cada bioma que ainda necessitam de proteção. Este mapa poderia ser posto em discussão pública, não somente com os estados e municípios, sendo cabível avaliar, em cada caso, qual o ente federativo que poderia assumir a responsabilidade por sua proteção", defende Márcio Santilli, coordenador de Política e Direito Socioambiental do ISA.

"Mas é preciso ter clareza de que, via de regra, estados e municípios não dispõem de quadros técnicos suficientes para avaliar a relevância socioambiental de cada área e estão mais sujeitos à pressão direta de eventuais interesses privados contrários à sua conservação", conclui Santilli. (Confira artigo de Márcio Santilli sobre esse assunto: http://www.socioambiental.org/nsa/direto/direto_html?codigo=2012-06-05-174159).

Reivindicações

"Estamos retomando o diálogo na CNPI [Comissão Nacional de Política Indigenista]. Nosso objetivo é traduzir essas discussões em ações concretas", afirmou, em entrevista coletiva, Marta Azevedo, há um mês no cargo de presidente da Funai.

Em junho de 2011, depois de fazer várias críticas ao governo, os representantes indígenas decidiram suspender sua participação na CNPI até que fossem ouvidos pela presidente. Eles estão participando da reunião do colegiado que ocorre desde segunda e termina hoje.

Marta afirmou que a aprovação do Estatuto dos Povos Indígenas, a criação da Conselho Nacional de Política Indigenista e a PEC 215, que transfere a atribuição da criação de TIs ao Congresso, serão temas que deverá tratar em encontros que pretende ter com líderes e bancadas parlamentares. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, frisou que o ministério já se posicionou pela inconstitucionalidade da PEC.

"Não somos contra um país rico. Mas somos contra a violação de direitos. Assim como a senhora, presidenta, sabemos o que é violência. Ao longo de mais de 500 anos, fomos torturados, humilhados e violentados", afirmou Sônia Guajajara, vice-coordenadora da Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira).

Ela entregou a Dilma um documento com oito reivindicações do movimento indígena. O texto lembra que, desde o início do atual governo, as comunidades indígenas tentam se reunir com a presidenta, sem sucesso. "Essa é uma oportunidade importante para iniciarmos um diálogo", afirmou.

Entre outros pontos, o documento cobra a demarcação e proteção de outras TIs, a ação do governo no Congresso para aprovação do Estatuto dos Povos Indígenas e o respeito à consulta livre, prévia e informada sobre empreendimentos que afetem os povos indígenas.

"Há algum tempo nossas propostas estão aí. Estamos lutando, na pressão, mas não temos avançado muito", avaliou Sônia, sobre o governo Dilma. "[A homologação anunciada] não é um favor que ela [a presidenta] está fazendo. É uma obrigação. E não significa muito diante de tantas terras que ainda precisam ser demarcadas. Do governo Dilma, foi o primeiro momento. Temos ainda muitos passos a dar."

Sônia mencionou os conflitos de populações indígenas do Mato Grosso do Sul e da Bahia como os que precisam ser resolvidos com maior urgência pelo governo. Ela reconheceu a oficialização da PNGATI como um passo importante, mas alertou que o movimento indígena vai cobrar com firmeza sua implementação.

Convidada a discursar, Sônia deu tom descontraído à solenidade em dois momentos: primeiro, disse que gostaria de ter sido convidada para ficar na fila de cadeiras onde estavam os ministros, e não na platéia; depois, pediu que Dilma assinasse uma cópia do texto com as reivindicações que entregou a ela, o que geralmente é feito para comprovar o recebimento desse tipo de documento por autoridades. A presidenta riu e assinou.



http://www.socioambiental.org/noticias/nsa/detalhe?id=3569
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