"Mais um indígena suicidado, Tania. Agora foi um indígena de 18 anos, do acampamento Ñu Porã. Sem nenhum documento. O corpo está aqui na frente, num carro funerário. (...) Enforcado, como sempre. Veio parar aqui pra gente tentar identificar algum parente dele, já que não tinha nenhum documento. Os boatos que correm é que tem parentes na aldeia Taquaperi, no município de Coronel Sapucaia, no sul do estado. (...) Como o IML de Dourados está desativado, o corpo está aí, 'passeando' dentro de um carro de funerária. Até agora o caso não teve desfecho; além do trágico, claro".
Neste caso específico, os (...) não se referem a cortes feitos por mim no texto, e sim a hiatos no tempo, na troca de mensagens, nas informações respondendo a perguntas que eu fazia, ao mesmo tempo em que trabalhava para o Mapa de Conflitos, lia e respondia outras mensagens urgentes, verificava as últimas sandices (como as que posto no final deste texto) de homens e mulheres enlouquecidos pelo ódio e pelo racismo, muitos se deixando insuflar e usar como massa de manobra.
Mudam as fronteiras, mas permanece o mesmo tipo de preconceito alimentado pela mídia corrupta. Que age a serviço da omissão de governos que não respeitam a Constituição, nem cumprem suas funções; da canalhice de um congresso que na sua maioria sequer merece a letra maiúscula; de juízes vendidos e de MPFs que esquecem as minorias e a Tutela e se preocupam exclusivamente com os 'colarinhos brancos' (Ah, PEC 37! Por esses com certeza eu não teria lutado!); dos diversos serviçais do capital, em resumo!
Mudam, também, as vítimas e sua posturas. Há os que enfrentam até mesmo generais com falas altivas, em Tenharim Marmelos. Há outros, que tiveram a coragem de por dias dizer à Presidência da República que não enviariam quatro ou cinco representantes, pois eram 140, até que o Secretário Geral mandasse a Belo Monte os aviões necessários para levar todos a Brasília. Há os que estão nas universidades, se formando e, de imediato, retornando para devolver a seus parentes, nos tribunais, o conhecimento que o sacrifício de sua mãe lhe garantiu nas academias. Há, ainda, aqueles e aquelas que a discriminação, o preconceito e a ameaça dos jagunços levaram às beiras da estradas ou aos acampamentos precários, ao álcool, à prostituição e, finalmente, ao desespero irremediável e à total desistência da vida.
É esta a vergonha com a qual estamos convivendo quase que diariamente. É esta a vileza com a qual de uma forma ou de outra muitos brasileiros e brasileiras estão compactuando, concordando e, até, defendendo, como mostram os acintes ao jornalismo do sul do Amazonas, que na verdade significam muito pouco, se considerarmos o que escrevem vermes com títulos universitários nas páginas de opinião dos chamados 'grandes jornais'.
Esse menino ainda sem nome de 18 anos um dia teve mãe, pai, família. Teve direitos ratificados por ene leis que este bendito país (com minúscula proposital, embora eu saiba que estou me referindo ao Brasil, e pela regras gramaticais o P deveria ser maiúsculo) assinou, sancionou, promulgou mas, por negociatas abjetas movidas pelo intuito de manter o poder, simplesmente desrespeita e renega.
Enquanto escrevo este desabafo, até onde sei seu corpo adolescente continua "'passeando' dentro de um carro de funerária", no Mato Grosso do Sul. No sul do Amazonas, Aurélio Tenharim e seus parentes permanecem na reserva, tratados por selvagens como se fossem eles os animais selvagens. Na Bahia, nesta última madrugada, os Tupinambá foram obrigados a se defender (segundo o G1) com tiros da Polícia Federal que decidiu, ela, se reintegrar de um território que a Justiça já reconheceu como indígena...
Neste momento, há um lado meu que sente muita vergonha de ser brasileira! Sou Negra, Tenharim, Munduruku, Tupinambá, Guarani, Kaiowá, Awá, Xavante, Terena e outros tantos! Eles são meus irmãos! Se meu lado branco é o que vende este País e tenta escravizá-los, decididamente renego-o!
http://racismoambiental.net.br/2014/01/por-mais-um-adolescente-suicidado-pela-nossa-sociedade-em-mato-grosso-do-sul-pelo-direito-a-luta-chega/
PIB:Mato Grosso do Sul
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