POTIGUARA COMEMORAM DOIS ANOS DE RETOMADA

Unuversidade Federal da Paraiba -João Pessoa-PB - 07/08/2005
O dia 04 de agosto de 2003 começou com a ocupação pacífica dos canaviais que a Usina Japungu possuía em gente a cidade de Marcação-PB, pelos índios Potiguara. Neste dia, índios de Marcação e das aldeias Vila Monte-Mór e Jaraguá, em Rio Tinto-PB, iniciaram o plantio de roçados de feijão e macaxeira, ainda no meio da cepa das canas recém-colhidas. Alguns dias depois uma liminar da justiça estadual e um Termo de Ajustamento de Conduta, acertado no Ministério Público Federal impediam índios e usineiros de continuarem qualquer atividade agrícola no terreno em questão até ser regularizada a situação fundiária da Terra Indígena Potiguara de Monte-Mór.

Quinze dias depois os índios acordam sobressaltados, as seis da manhã, com a notícia de que a usina Japungu estava com dois tratores, um caminhão e cerca de cem homens destruindo os roçados que eles haviam deixado como estavam desde o dia do acordo, e plantado uma nova soca de canas. Mais de duzentas pessoas acorreram até os roçados de onde expulsaram os trabalhadores da usina e apreenderam três veículos da mesma (um trator, o caminhão e uma saveiro). Imediatamente os líderes indígenas de Marcação acionaram uma rede de aliados e instituições para salvaguardá-los das represálias das usinas: FUNAI, Conselho Estadual de Direitos Humanos, CIMI, Universidade Federal da Paraíba, Ministério Público Federal, Polícia Federal e a imprensa.

A palavra de ordem agora era retomada, a intenção, resistir e a estratégia, montar acampamento em torno dos veículos. O apoio chegou de vários lugares, principalmente das aldeias de Jaraguá, Monte-Mór, Nova Brasília, Lagoa Grande, Jacaré de São Domingos e Forte. A FUNAI providenciou cestas básicas, para sustentar as famílias que haviam perdido seus roçados e estavam acampadas em barracas de lona e palha de cana. Durante as noites o toré e o coco-de-roda mantinham a vigília desperta. Ameaças foram constantes e até mesmo tiros de intimidação foram disparados durante a madrugada por capangas da usina, que tentavam incendiar o canavial vizinho a área retomada. Esses atos de terrorismo só não continuaram porque o Procurador Duciran Farena determinou que a Polícia Federal fizesse rondas na área e desse proteção aos índios. Com tudo isso os índios resistiram, transformaram o canavial em lindas plantações dos mais diversos gêneros e reconstruíram a aldeia de Três Rios, arrasada na década de 1980 pela chegada das usinas.

O dia 06 de agosto de 2005 começou com muito sol e uma brisa forte vinda do mar. A cidade de Marcação e a aldeia Três Rios, com suas 55 casas e mais de 400 hectares de roçados fervilhavam com a agitação das pessoas indo e vindo com os preparativos para a festa de comemoração dos 2 anos de reconquista da aldeia. O cacique Bel e o vice-cacique Josesí, andavam de um ponto ao outro verificando os últimos acertos: bancos para a missa, mesas para a distribuição de comida, lenha para os fogões onde seria feita a feijoada e o churrasco, gelo para as caixas de isopor, refrigerantes para aplacar a sede. Lena, esposa de Bel, e mais um batalhão de pessoas, cuidavam da cozinha. Josafá, chefe de posto da FUNAI, dirigia uma caminhonete transportando os índios da Baía da Traição para a festa. Irmã Juvanete, ajudava na preparação dos últimos detalhes da missa junto com Padre Penedo e o grupo de jovens da igreja que com teclado, baixo, guitarra e bateria animariam a missa. O espaço da missa e da festa: a oca comunitária, onde está desfraldada uma bandeira com a imagem de São Juan Diego, índio mexicano recentemente canonizado pela Igreja Católica.

Como durante a retomada, os apoios vieram de vários lugares, principalmente dos próprios índios, que forneceram o feijão, a macaxeira e as verduras de seus roçados, além da cota para o gelo e os refrigerantes, e da prefeitura de Marcação, que contribuiu com a carne.

As visitas, esperadas com ansiedade, chegaram na hora combinada: pastorais da igreja, representantes de entidades de direitos humanos e da UFPB. O prefeito (Paulo Sérgio), a vice-prefeita (Íris) e alguns vereadores de Marcação, todos indígenas, se fizeram presentes.

Por volta das onze horas começou a missa, que foi aberta com as palavras emocionadas do cacique Bel, que lembrou da luta e da união de todos os presentes em prol da conquista das terras indígenas e agradeceu, in memoriam, a Seu Valdemar, cacique da Vila Monte-Mór, e Seu Pedro Máximo, pai do pajé de Três Rios, que desde o inicio da retomada, esteve presente, sendo sua a primeira casa a ser construída na aldeia. Após a fala de Bel, a missa foi dedicada às almas de várias pessoas falecidas da comunidade, inclusive de João Baía, fundador da aldeia Três Rios, no século XIX.

Durante a missa, os ofertórios e a comunhão foram dedicados à luta dos índios e aos frutos da terra. Ao invés de pão, o beiju de mandioca foi abençoado e repartido pelas mãos de todos. Antes do fim da celebração religiosa foi realizado o batizado de algumas crianças.

Terminada a missa, a palavra foi concedida ao prefeito de Marcação e à Pró-Reitora de Extensão e Ação Comunitária da UFPB, profª. Lúcia Guerra, que externaram o seu apoio incondicional á luta dos índios Potiguara.

Neste momento chegou um ônibus trazendo os índios da Vila Monte-Mór, liderados pelo cacique Dedé e de Jaraguá, pelo cacique Aníbal. Robinho, cacique de Camurupim, Capitão, líder indígena e Iolanda, coordenadora da Organização dos Professores Indígenas Potiguara já estavam presentes desde cedo. Ao final da tarde chegaram os cacique Carlos, de Jacaré de São Domingos e Carioca, da Estiva Velha, bem como Pedro, professor da aldeia Nova Brasília (Ibiquara).

Depois do almoço, dois grupos de teatro infantil, compostos por índios de Marcação (grupo Fala Curumim) e Vila Monte-Mór (grupo Anama-Guaçu), apresentaram peças sobre a história da luta de suas aldeias. Esta parte da festa foi encerrada com um animado "parabéns pra você" e a divisão de um bolo de dois metros de comprimento entre os presentes.

A partir das duas da tarde o toré, o coco e a ciranda animaram os índios até o cair da noite, tendo uma segunda rodada de feijoada e churrasco sido servida a partir das quatro horas.

Uma celebração da vida, da energia e da força de um povo. Na memória dos falecidos celebrada na missa, no batismo dos bebês, na distribuição farta e generosa dos frutos da terra e na animação das danças os Potiguara reafirmaram o seu compromisso de lutar pela demarcação das suas terras e pela melhoria de sua qualidade de vida.

A luta continua. A FUNAI e a FUNASA parecem ainda ouvir os caprichos da Usina e se deixam pressionar pela exigência absurda de que a Japungu faça o levantamento de quantas casas há na aldeia para que se possa definitivamente instalar o abastecimento regular de energia e água, bem como a construção dos banheiros e das fossas. Enquanto isso, os índios vão construindo suas casas e ampliando os roçados, tomando em suas mãos as rédeas de seu destino, se organizando e enfrentando as adversidades, com garra e união.





PARABÉNS ALDEIA TRÊS RIOS!

PARABÉNS POVO POTIGUARA!



Grupo de Trabalho Indígena

Setor de Estudos e Assessoria a Movimentos Populares

Universidade Federal da Paraíba
PIB:Nordeste

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