Floresta de gente, floresta de semente

ISA- https://medium.com/@socioambiental - 18/11/2016
As nuvens estavam carregadas no céu, mas não encobriram os sorrisos de indígenas, agricultores familiares e outros coletores da Rede de Sementes do Xingu que participaram do primeiro plantio de 200 mil árvores na Fazenda Rancho 60, em Bom Jesus do Araguaia (MT), parte do projeto Amazonia Live que plantará o total de um milhão de árvores em sua primeira fase. Mesmo com um trator atolado na lama e embaixo de chuva, o trabalho de plantar pouco mais de uma tonelada de sementes foi cumprido com a satisfação de saber que aqueles hectares serão reflorestados e que em alguns anos as áreas degradadas serão recuperadas e ajudarão a proteger as nascentes e a água da bacia do rio Xingu.

Uma iniciativa do Rock in Rio, o Amazonia Live irá plantar nos próximos três anos a maior quantidade de árvores possível nas cabeceiras do rio Xingu, uma das regiões que mais perdeu floresta no Brasil. São quase 200 mil hectares de matas de beira de rio desmatadas. E para cumprir tal desafio, a organização de um dos maiores festivais do mundo procurou o Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio) para que, juntos, encontrassem as parcerias necessárias e ideais para conseguir manter a floresta em pé. "Nós já havíamos trabalhado com o Instituto Socioambiental (ISA) e com a Rede de Sementes do Xingu. Foi a oportunidade perfeita para fortalecermos o trabalho com estes parceiros", conta Alexandre Ferrazoli, responsável pela gestão de programas do Funbio.

Além de recuperar a área desmatada da floresta, o projeto ajudará a preservar a água na região e fortalecerá a economia local já que as sementes utilizadas no plantio são fornecidas pela Rede de Sementes do Xingu, formada por coletores que trocam e vendem sementes de árvores e outras plantas nativas da região. Com quase dez anos de existência e de experiência, a Rede surgiu a partir da necessidade de recuperar as áreas degradadas e as nascentes do rio e da oportunidade de valorizar a floresta em pé ao mesmo tempo em que gera renda para os coletores.

"A rede é uma articulação de cerca de 500 indígenas, agricultores familiares, pesquisadores, organizações parceiras que tem como objetivo reunir os saberes e a diversidade dos povos para coletar, conhecer e valorizar as sementes da floresta", explica Rodrigo Junqueira, coordenador do Programa Xingu do ISA.


Muvuca de gente, muvuca de semente


O plantio marcou a 2a Expedição da Rede de Sementes do Xingu, iniciativa que reuniu mais de 50 pessoas durante três dias e que percorreu toda a cadeia de produção, beneficiamento e plantio de sementes florestais. Este importante momento de troca de conhecimento e de saberes entre os coletores sobre as diferentes técnicas utilizadas na coleta e no beneficiamento das sementes teve como um dos pontos altos a preparação e o plantio da muvuca de sementes do Amazonia Live no último dia do encontro.

Indígenas de cinco etnias diferentes e agricultores familiares dos diversos assentamentos que fazem parte da Rede puderam plantar com suas próprias mãos as sementes que, outra vez, eles mesmos coletaram. "É muito incrível poder fazer parte de um plantio pela primeira vez", conta Milene Alves, jovem coletora e responsável pela Casa de Sementes de Nova Xavantina, no Mato Grosso. "Eu sei que essas sementes foram coletadas por pessoas que eu conheço e poder estar aqui e ver que a semente que passou pelas minhas mãos está sendo plantada é uma realização. Eu sinto muito orgulho do meu trabalho", ela conta sem disfarçar a alegria que está sentindo.

A técnica da muvuca utilizada no plantio de árvores é uma mistura de sementes nativas e de adubação verde com areia que forma um insumo homogêneo propício para a formação da estrutura da floresta. Nessa mistura, há espécies que vão crescer logo no primeiro mês, que germinam rapidamente e logo formarão a cobertura do solo. É o caso do feijão de porco que também é uma espécie de adubação verde que fixa nitrogênio na raiz e que permite que as outras espécies nativas cresçam mesmo em solo degradado.

"Eu não acreditava na muvuca", explica Artemizia Moita, gerente ambiental do grupo Agropecuária Fazenda Brasil, do qual a Rancho 60 faz parte. "Eu estava acostumada a recuperar as áreas degradadas com mudas e não achava que a muvuca traria resultado. Hoje, mudei de ideia e sou fã da técnica porque é possível ver resultado a partir do segundo ano depois do plantio. Dos 350 hectares que já recuperamos na AFB, mais de 85% foi plantado com muvuca e todas as áreas estão em processo de recuperação muito bom."

A técnica da muvuca utilizada no plantio de árvores é uma mistura de sementes nativas e de adubação verde com areia que forma um insumo homogêneo propício para a formação da estrutura da floresta. Nessa mistura, há espécies que vão crescer logo no primeiro mês, que germinam rapidamente e logo formarão a cobertura do solo. É o caso do feijão de porco que também é uma espécie de adubação verde que fixa nitrogênio na raiz e que permite que as outras espécies nativas cresçam mesmo em solo degradado.

"Eu não acreditava na muvuca", explica Artemizia Moita, gerente ambiental do grupo Agropecuária Fazenda Brasil, do qual a Rancho 60 faz parte. "Eu estava acostumada a recuperar as áreas degradadas com mudas e não achava que a muvuca traria resultado. Hoje, mudei de ideia e sou fã da técnica porque é possível ver resultado a partir do segundo ano depois do plantio. Dos 350 hectares que já recuperamos na AFB, mais de 85% foi plantado com muvuca e todas as áreas estão em processo de recuperação muito bom."

A parceria da Rede com a Universidade do Estado do Mato Grosso (Unemat) reforça esse caráter já que um time de pesquisadores está à disposição dos coletores para realizar testes em laboratório que controlam luz e temperatura, fatores que influenciam na germinação das mesmas. Dessa forma, é possível entender qual a melhor forma de quebrar a dormência das sementes de algumas espécies e como realizar o plantio, por exemplo.

Além dos testes realizados em laboratório, cada uma das nove Casas de Sementes têm um responsável que realiza o teste de emergência em campo para também garantir a qualidade das sementes antes que sejam disponibilizadas e vendidas no mercado. "Hoje pouco se conhece das nossas florestas e das espécies nativas que aí estão e não será possível recuperar a Amazônia sem o insumo básico que é a semente florestal. A Rede de Sementes tem conhecimento acumulado para poder propiciar restauração florestal com qualidade para que a gente possa ter a Amazônia reflorestada no futuro", afirma Junqueira.


O buriti das mulheres Xavante


Parte da troca de experiências, saberes e conhecimentos tradicionais aconteceu na Terra Indígena Pimentel Barbosa, dos índios Xavante. Como parte de sua cultura, eles coletam sementes há muitos anos e, desde 2013, participam da Rede de Sementes do Xingu. O cacique José Guimarães Tserenhomo, líder da aldeia Santa Cruz (Ripá), recepcionou o grupo de coletores e organizou uma expedição de coleta com o grupo Nödzö'u-as mulheres que coletam junto com suas filhas e netas-para que todos vivenciassem a colheita do buriti como é tradicionalmente realizada pelos Xavante.

O sol havia nascido há pouco tempo, mas o calor já era intenso quando os coletores começaram a caminhada no pé da Serra do Roncador até os buritizais. Com cestos de palha presos por tiras de tecido colorido em suas cabeças, elas rapidamente colhem os frutos caídos no chão e comem o buriti enquanto caminham. Assim que enchem os cestos, os cobrem com folhas das árvores e amarram uma tira de cipó para que fiquem bem presos e os frutos não caiam na caminhada de volta para aldeia.

As mulheres Xavante foram as primeiras a entrar no meio do cerrado e da floresta para coletar os frutos e as últimas a retornar. Os outros coletores compartilhavam suas impressões sobre a experiência e comentavam rindo entre si: "Se eu tivesse que caminhar tanto assim para coletar sementes, acho que desistiria", disse dona Vera, coletora de Nova Xavantina, admirada com o trabalho duro das indígenas.

Muitos dos coletores são agricultores familiares de assentamentos da região das cabeceiras do Xingu e coletam as sementes próximas à suas residências e as beneficiam utilizando instrumentos mecânicos. As mulheres Xavante, por sua vez, além de andarem longos trajetos para buscar as sementes, ainda usam pedras para beneficiar manualmente o buriti, o baru, o jatobá e o murici, entre outras espécies.

"Quando começamos o trabalho, não sabíamos nem beneficiar as sementes e quando olho para o que a Rede virou, eu sinto muito orgulho. Estamos contribuindo com o meio ambiente, protegendo as nascentes e a nossa água para a essa e para as próximas gerações, além de estar gerando renda com floresta e valorizando a diversidade."



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PIB:PIX

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