Tropa de elite do Ibama

FSP, Ciência, p. B7 - 22/12/2016
Tropa de elite do Ibama

FABIANO MAISONNAVE
ENVIADO ESPECIAL A JI-PARANÁ (RO)

Após quatro dias de operação na mata contra madeireiros e garimpeiros, na semana passada, o GEF (Grupo Especializado de Fiscalização do Ibama) listou, em relatório, a destruição de quatro escavadeiras e seis caminhões, a apreensão de munição e ouro -e a libertação de um curió.
A preocupação com um passarinho em meio a arriscadas incursões de helicóptero em terras indígenas com armas dá a medida da diferença entre o GEF e uma força tática policial tradicional.
Formado por nove fiscais do Ibama, todo o grupo tem curso superior. Há biólogos, engenheiros florestal e de pesca, um publicitário e um oceanógrafo que cursou doutorado na Alemanha. Em comum, o idealismo pela proteção ambiental.
"Temos uma massa crítica e, ao mesmo tempo, uma equipe com lado operacional e técnico", afirma Roberto Cabral, 47, coordenador do GEF e ex-professor biologia de uma escola de ensino público em Juiz de Fora (MG).
"Não estamos só prendendo o garimpeiro. Entendemos a questão da degradação, qual a legislação que está sendo afetada."
Embora já estivesse previsto desde a década de 1990, o GEF só foi criado em 2014. A seleção se deu internamente, por meio de um curso de 45 dias no estilo "pede pra sair" -quem não passava nos testes físicos e de resistência acabava eliminado.
O objetivo era padronizar as operações e aumentar a segurança dos fiscais em campo, principalmente depois que o Ibama foi autorizado em 2008, por meio de decreto, a destruir equipamentos usados para crimes ambientais achados em áreas protegidas.
O grupo é acionado para as missões mais espinhosas em áreas protegidas ao longo do arco do desmatamento da Amazônia Legal, a imensa faixa de terra que vai do Maranhão a Rondônia.
Numa operação padrão, eles são transportados de helicóptero até áreas de difícil acesso com presença de madeireiros e garimpeiros, muitas vezes armados e escondidos na mata fechada. A comunicação é precária, e a logística dificulta o envio rápido de reforço ou socorro médico.
No incidente mais grave, em outubro de 2015, Cabral foi baleado por um tiro de espingarda de caça na Terra Indígena Arariboia, no Maranhão. Os sete estilhaços de chumbo se alojaram no braço direito, no ombro e no tórax.
Em outro incidente, um helicóptero do Ibama levou um tiro no sul do Pará. A bala atravessou a fuselagem e se alojou no banco traseiro, a 5 cm da cabeça do piloto.
"A gente não está lidando com pessoas que apenas cometem uma irregularidade ambiental. São bandidos, criminosos", diz Cabral. "Várias vezes, a gente ouve: 'Ah, são trabalhadores'. Trabalhador não rouba meio ambiente."
Além da ameaça de tiros, os integrantes sofrem com o esforço físico. Caminhadas longas pelo calor úmido da floresta são comuns, e o peso do equipamento, que inclui colete a prova de balas, é de pelos menos 12 kg. Ao menos três deles precisaram ser operados após romper ligamentos.
MUDANÇA DE VIDA
Os integrantes, todos homens, não têm dedicação exclusiva ao GEF nem recebem a mais por participar no grupo. Espalhados pelo país, trabalham na maior parte do ano em funções como fiscalização de lagosta, no Nordeste, e tratamento de animais silvestres resgatados, no Sudeste.
Mesmo sendo voluntária, a participação no grupo armado não ocorreu sem conflitos pessoais internos para os integrantes, quase todos vindos de ambientes mais pacifistas, como cursos de biologia.
Um dos agentes, que trabalhou por 16 anos em ONGs de educação ambiental, disse que demorou um pouco a se acostumar com o uso de armas. Nos últimos anos, perdeu amigos ambientalistas, que acusam o Ibama de estar se militarizando.
"Nunca pensei que ia pegar em arma, falar alto, algemar uma pessoa, mas não sofro mais com isso", afirmou o engenheiro florestal de 44 anos, não identificado por questão de segurança. "Não é pelo diálogo que você vai cessar o crime ambiental."
Outro membro do GEF, formado em biologia, também acredita que a dissuasão é necessária para preservar o meio ambiente. "A educação ambiental só funciona até os dez anos de idade."
Os resultados que mais orgulham o GEF foram as ações contra a extração ilegal de madeira em terras indígenas do Maranhão. Somente neste ano, foram destruídas 32 serrarias no Estado, em ações coordenadas com o Ministério Público e a Polícia Federal, resultando no desmantelamento de toda a cadeia.
Por outro lado, há operações frustrantes. Recentemente, o GEF perseguiu por cinco dias madeireiros na Terra Indígena Cachoeira Seca (PA), que conseguiram escapar derrubando árvores na estrada para obstruir a passagem dos agentes.
Internamente, o Ibama faz um balanço positivo do GEF, cujo efetivo deve ser dobrado em 2017, com a realização de um novo curso interno. "O ideal seria ter 30 pessoas, para ter uma equipe operando, uma de prontidão e outra treinando", diz Cabral.
CURIÓ
O curió libertado pelo GEF estava numa fazenda usada como base de apoio para o helicóptero durante operação na Terra Indígena Sete de Setembro (MT/RO).
O dia havia sido especialmente tenso. Índios paiter-suruís aliciados pelos garimpeiros impediram que os agentes queimassem a maior parte do equipamento. Para evitar o confronto, tiveram de abortar a operação.
A "tolerância zero" contra crimes ambientais é marca registrada de Cabral, que começou no Ibama de forma voluntária, percorrendo feiras aos domingos para localizar pássaros silvestres à venda e, depois, ajudando na recuperação de animais machucados.
"Pode não fazer diferença para o meio ambiente como um todo, mas é uma diferença e tanto para o curió", diz.
"Posso dar liberdade a esse animal e vou deixá-lo em cativeiro, preso pro resto da vida? Não. Tenho o poder de mudar a vida daquele animal, restituir a liberdade. Vou sempre soltar o curió.

FSP, 22/12/2016, Ciência, p. B7

http://www1.folha.uol.com.br/ambiente/2016/12/1843562-com-equipe-de-nove-tropa-de-elite-do-ibama-tem-publicitario-e-biologos.shtml
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