Índio vira samba enredo e escola do RJ provoca a ira do agronegócio em MS

Campo Grande News- http://www.campograndenews.com.br - 10/01/2017
São pelo menos três as notas de repúdio que federações e associações voltadas ao agronegócio em Mato Grosso do Sul emitiram à escola de samba carioca Imperatriz Leopoldinense. No Carnaval 2017, o samba enredo "Salve o verde do Xingu, a Esperança" faz um alerta sobre os riscos que ameaçam 16 etnias que resistem no Xingu e outras espalhadas pela Amazônia.

Apesar de não citar nenhuma das etnias sul-mato-grossenses, o samba descreve um cenário presente em todo País, onde o avanço do agronegócio não olha ao seu redor, desmatando e poluindo com agrotóxicos córregos que são a única fonte de água de comunidades. Caso entrasse especificamente nos terena e guarani-kaiowá, o enredo traria ainda o genocídio e inúmeros conflitos armados que terminaram em mortos e feridos em Mato Grosso do Sul.

A última nota de repúdio que circulou foi emitida nesta terça-feira (10), pela Acrissul (Associação dos Criadores de Mato Grosso do Sul).

Em nome dos produtores rurais, a associação atribuiu à escola um "extremo desconhecimento da causa e da história" e diz que a letra manifesta em sua composição uma "versão odiosa, repugnante e preconceituosa, totalmente distorcida do setor agropecuário brasileiro, repassando uma imagem de destruidor de florestas e da natureza, invasor e monstro, num evento cultural de conotação internacional que é o Carnaval".

O texto ainda declara que os trabalhadores do agronegócio "perdoam aqueles ignorantes do samba" e que difamar o agronegócio é ignorar a realidade social, econômica e estatística brasileira, que vem desde o Plano Real servindo de âncora para a economia nacional.

Assinada pelo presidente da instituição, Jonatan Pereira Barbosa, a nota termina numa tentativa falha de brincar "quem não gosta do agro bom sujeito não é".

Desde o lançamento do samba enredo, a Imperatriz tem sido bombardeada pelos setores que representam o agronegócio. No Facebook, o carnavalesco da escola, Cahê Rodrigues, explica que quando resolveram levar para a avenida o Xingu, assumiram o desafio de apresentar mais que um desfile voltado à cultura e às tradições das etnias indígenas.

"O clamor, destacado no título, pode ser traduzido como a voz que teimamos em não ouvir desde o dia em que os europeus descobriram oficialmente estas terras, batizadas com o nome da madeira que, antes da cana-de-açúcar, do ouro, dos diamantes e da escravaria, começou a enriquecer os cofres de Portugal.

Ao longo dos séculos, aprendemos que o povo brasileiro é resultante de três raças: o índio, o negro e o branco. No entanto, nossa História sempre foi contada pelos brancos, pois negros e índios raramente tiveram a chance de expressar tudo que tiveram de enfrentar para ajudar a construir essa História. Infelizmente, pouco sabemos sobre eles, além da certeza de que milhões de vidas foram ceifadas para dar passagem ao que os colonizadores do passado e do presente rotulam como "progresso"".

O carnavalesco também cita o samba enredo de 2015, quando a escola foi até a África e fez um alerta sobre atitudes racistas e do ano passado, com a música sertaneja que inclusive mostrou a lida do homem do campo e da importância da agropecuária do Centro-Oeste brasileiro no abastecimento de alimentos.

"Quando decidimos falar sobre o índio e, em especial, sobre a importância da reserva do Parque Indígena do Xingu, nosso objetivo não é outro senão fazer um alerta sobre os riscos que ainda ameaçam as 16 etnias que ali resistem e, indiretamente, muitas outras espalhadas pela Amazônia", frisa o carnavalesco.

O representante da escola afirma que nunca foi intenção da Imperatriz agredir o agronegócio, "setor produtivo de nossa economia a quem respeitamos e valorizamos" e que buscaram na composição, combater o "uso indevido do agrotóxico, que polui os rios, mata os peixes e coloca em risco a vida de seres humanos, sejam eles índios ou não, além de trazer danos em alguns casos irreversíveis para nossa fauna e flora".

Além de chamar atenção para o medo e a preocupação permanentes dos xinguanos, "que a cada noite temem uma nova invasão de suas terras. Ou imaginam a catástrofe que a usina de Belo Monte desencadeará no ecossistema de toda aquela região, inundando aldeias, igarapés e levando na força de suas águas as chances de sobrevivência de sua gente. Tive a oportunidade de ver isso pessoalmente. Conversei com eles, ouvi a sua angústia", relata Cahê.

Advogado indígena e pesquisador, Luiz Henrique Eloy, analisa que o samba enredo é importante para o movimento como um todo. "É uma oportunidade da sociedade conhecer, pelo viés do Carnaval, a realidade dos povos indígenas que temos denunciado há muito tempo", diz.

Sob análise de Eloy, a ideia de preservar o Meio Ambiente é considerar também a preservação dos povos indígenas e de sua cultura.

"Partes do samba enredo denunciam exatamente isso, esse capitalismo selvagem do agronegócio, com uso de agrotóxicos, desmatamento. 'Dá lucro?' Mas qual é o preço que se paga por esse desenvolvimento? Vão ter vidas ceifadas e todo um prejuízo ambiental, não só dos povos indígenas, mas de toda humanidade", completa.



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