"A arte faz o índio sair da invisibilidade e entrar no universo de pensador", diz Jaider Esbell

Diário Catarinense- http://dc.clicrbs.com.br - 11/04/2017
Ancestralidade, tradição, contemporaneidade, política e sobrevivência são o mote da exposição de arte indígena It Was Amazon/Era uma vez Amazônia, de Jaider Esbell, do povo Makuxi, de Roraima. O artista, escritor e produtor cultural, que tem uma galeria de arte indígena contemporânea em Boa Vista e vive profissionalmente da arte desde 2010, está percorrendo o Brasil com a mostra desde 2016 e SC é o primeiro estado da região Sul a recebê-la. A exposição, com 16 obras, abre nesta terça-feira (11), na Capital.

Nascido onde hoje é a Terra Indígena Raposa - Serra do Sol, Jaider descobriu habilidades artísticas na infância, mas trabalhou na Eletrobras e formou-se em Geografia antes de se dedicar exclusivamente às artes. Em 2016, foi indicado ao Prêmio PIPA de arte contemporânea brasileira e ganhou na categoria online, com votos do público. Já foi convidado para expor e dar aulas na Pitzer College, nos Estados Unidos, e é realizador do Encontro de Todos os Povos, evento em Roraima que promove o protagonismo dos índios.

Em residência artística no coletivo NACASA, na Capital, onde vai trabalhar e receber o público interessado em seu trabalho até o fim da exposição, Jaider recebeu a equipe do DC para um papo. Confira:


Arte indígena

Meu trabalho é sempre visto com bastante espanto, porque eu fujo um pouco da ideia do indígena como um cidadão acanhado, envergonhado e até meio medroso ao se expor e reivindicar a identidade num país em que é muito massacrado. A arte faz o índio sair da invisibilidade e entrar num universo bem restrito que é o de pensador, de pessoas que influenciam a sociedade.


Itinerância

Comecei a trabalhar com o canson preto e a caneta branca e fiz alguns desenhos sobre a Amazônia atual com uma perspectiva de desromantizá-la. A itinerância começou em julho de 2016 e não faz parte de nenhum edital, não tem financiamento e é sustentada com a venda do meu material. O mote desse trabalho vem carregado desses elementos e signos, questões da identidade, espiritualidade e referências ancestrais nessa contemporaneidade. O desafio é traduzir essas informações em algo acessível nesse grande vácuo que tem entre o imaginário indígena e a realidade.


Índio contemporâneo X tradições ancestrais

Quando você sai em campo para encontrar a vida prática do índio, você se surpreende. Tem indígenas tribais que vivem nus, "selvagemente" na floresta. Já no Maranhão, por exemplo, encontrei uma tribo de índios aparentemente "descaracterizados" na fisionomia, índios brancos, loiros, com uma espiritualidade e uma religião bastante sincrética, misturando vários elementos da cultura afro. A diversidade indígena no Brasil é muito grande. Mas as realidades no Brasil são essas, tem o índio selvagem, que tá correndo com medo dos madeireiros, das fazendas, que não têm para onde ir e vai ter que sair da floresta ou então morrer. E tem um índio mais conectado com o mundo, que está trabalhando com coisas nunca trabalhadas pelos índios.


Representatividade

Politicamente, é pouquíssima. E, quando conseguimos, a estrutura política inviabiliza que tenhamos algum protagonismo. Existe toda uma política de desestruturação da organização indígena para evitar que consigamos acessar o parlamento. É um desafio urgente entre nós. O maior risco é perder as políticas públicas que são garantidas por meio de lutas de anos. As pessoas vão para um limbo cultural e social, não têm recurso nem estudo para alcançar um trabalho na cidade, não têm mais terra nem segurança para se viver no campo. É uma forma política e administrativa de extinguir vários povos.


Bolsonaro (Na última semana, o deputado disse que, se eleito, acabaria com as reservas indígenas)

É lamentável, mas isso que o Bolsonaro fala com muita tranquilidade e que muita gente entende como uma irresponsabilidade é na verdade um desejo de muitos políticos e cidadãos brasileiros, de dar um basta nessa história de existir índio no Brasil. Eu não sei exatamente por que as pessoas têm vergonha de serem como são, de virem de onde vieram e dessa tentativa de exterminar o índio como se ele fosse uma mancha no currículo. É preocupante, e nós sabemos que tem muitos indígenas que estão sem informações o suficiente para entender a gravidade disso e engrossar essa campanha de resistência. É um perigo real que temos e eu não me espanto se isso acontecer.



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PIB:Roraima/Mata

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