Centro Boldrini faz parceria com associação para tratar crianças indígenas com câncer

G1 g1.globo.com - 27/05/2017
O Centro Boldrini, referência na América Latina no combate ao câncer infantil, e a Associação Expedicionários da Saúde, que leva atendimento médico a populações indígenas em regiões isoladas, fecharam uma parceria para o tratamento de índios de até 18 anos que tenham câncer ou doenças do sangue.

Segundo o médico Ricardo Affonso Ferreira, que faz parte da associação, a ideia da parceria surgiu depois de um menino índigena da etnia macuxi, de 12 anos, que vive em Raposa Serra do Sol, em Roraima, precisar de tratamento especializado para Leucemia Linfóide Aguda (LLA). De acordo com o Boldrini, ele é o primeiro indígena a ser tratado pelo hospital de Campinas.

"Nos anos de 2013 e 2014, fizemos duas expedições lá [...] O pai do menino, que é o tuxaua (líder), nos ajudou muito e ficamos amigos. Ele mostrou o Tejo Vermelho, que é a aldeia deles[...] Assim que internou o filho em Boa Vista, a mãe entrou em contato com a associação. Aí, conversei e peguei a vaga. Depois de dois dias já vieram. A partir disso, eu conversei com a doutora Silvia e nós fizemos agora um acordo entre os Expedicionários e o Boldrini", explica o médico.

Ferreira destaca ainda que em Roraima a criança não teria o mesmo tratamento que está recebendo no Boldrini.


Da aldeia para Campinas

A mãe do menino, Ana Bárbara Barros Macuxi, de 37 anos, que é agente indígena de saúde, conta que a doença pegou todos na aldeia, que tem 95 pessoas, de supresa, já que é o primeiro caso na família.

Ana Bárbara conta que a LLA foi descoberta mesmo no Centro Boldini, já que em Roraima os médicos apenas tinham suspeitas. "Nós descobrimos aqui a doença", explica.

Segundo a mãe, entre o início dos sintomas na aldeia e a chegada em Campinas para o tratamento tudo foi muito rápido. Começou com uma febre no início de abril que não passava e com inchaços nos gânglios após a criança tomar a vacina da gripe.

"Passou uma semana dando febre, e foi aí que apareceu 16 gânglios no corpo. Fomos no hospital lá, o médico só passou um remédio para garganta. Voltamos pra casa, dois dias não queria baixar a febre, foi aí que a gente foi para a capital no dia 30 e foi para o hospital e ficou lá mesmo. Boa Vista fez exames, raio-x, tomografia e foi na tomografia que acusou", lembra a mãe.

Ana Bárbara conta que chegou com o filho em Campinas no dia 12 de maio e que isso foi possível porque recebeu ajuda da associação. "Quando ele chegou tava paralisando um rim, tava bem debilitado. O olho dele tá vermelho, porque teve hemorragia e tudo", explica.


Tratamento

No entanto, a mãe conta que desde então já percebeu melhora na criança. Ela explica que o filho está fazendo quimioterapia duas vezes por semana.
"O medicamento que ele está tomando é esse que a doutora está lutando. Desde que chegou aqui já está bem melhor. Eu tenho fé que ele vai ficar bom aqui", ressalta Ana Bárbara.

A médica Larissa Rodrigues Prandi, oncologista que acompanha o caso o menino, afirma que ele está respondendo bem ao tratamento.


Asparaginase

A Asparaginase usada pelo Boldrini é importada de laboratórios alemães. E até o início deste ano, este era o medicamento contra a leucemia adquirido pelo Ministério da Saúde e repassado aos hospitais.

Mas, no início deste ano, o Ministério da Saúde fez uma mudança e passou a importar um medicamento chinês chamado Leuginase para combater LLA.

A importação do Leuginase foi questionada na Justiça pelo Centro Boldrini. No pedido, o hospital pedia que a União fosse obrigada a comprar 50 mil frascos do medicamento usado anteriormente.

No último dia 12, a Justiça Federal determinou que o Ministério da Saúde fizesse a importação da Asparaginase alemã para qualquer hospital do Brasil que realize o tratamento da doença pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e pedisse o produto por via judicial.


Testes

De acordo com a oncologista e presidente do Boldrini, Sílvia Brandalise, a quantidade de proteína (impureza) no remédio europeu é de 0,5%. O teste encomendado pelo Boldrini e executado por um laboratório americano mostrou que a Leuginase tem índice de contaminação de 40%.

O primeiro teste e
ncomendado pelo centro, feito pelo Laboratório Nacional de Biociências (LNBio), já havia apontado que o produto apresenta 398 impurezas.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou a importação do Leuginase pelo Ministério da Saúde, mas informou que a responsabilidade da qualidade do produto é do importador.

Na sexta-feira (19), o hospital de Campinas recebeu um novo lote, comprado com recursos próprios, e voltou a tratar crianças com a leucemia. Mas, o Ministério da Saúde disse que vai recorrer da decisão judicial.

Na semana passada, o Ministério da Saúde enviou uma nota técnica a hospitais, associações e entidades do setor para informar que testes oficiais teriam comprovado a qualidade do medicamento Leuginase.

No documento, o ministério apontava que dois lotes distintos do Leuginase - que tem como princípio ativo a L-asparaginase - foram testados pelo Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde. A unidade é ligada à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e pré-qualificada pela Organização Mundial de Saúde (OMS), diz a pasta.

Segundo esses testes, o produto chinês mostrou "capacidade esperada de ação contra o câncer" e "parâmetros adequados para uso". A nota técnica também dizia que "não foram encontrados contaminantes bacterianos".

No entanto, o Centro Boldrini afirmou ao G1 nesta semana, que enviou um ofício ao diretor do Ministério da Saúde pedindo esclarecimentos sobre a nota técnica divulgada pela instituição, na semana passada, que descartava risco no uso do medicamento chinês Leuginase contra leucemia.

No documento, o centro cobra estudos que comprovem a eficácia do produto e afirma que a nota técnica divulgada pelo Ministério da Saúde não atende aos requisitos básicos das pesquisas científicas realizadas neste caso.


Bulas

Psicose, tricomoníase (parasita) e a ausência total de estudos. Os três elementos estão presentes na bula da Leuginase, medicamento chinês para leucemia. A crítica dos especialistas é que a troca do remédio feita pela União prejudica o tratamento das crianças, faixa etária mais atingida pelo problema, porque ele não tem comprovação de eficácia.

O G1 teve acesso às duas bulas e consultou um especialista em hematologia pediátrica, que apontou divergências entre os documentos. O governo federal explicou, em nota oficial, que o medicamento está dentro do padrão de referência e "já tem sido utilizado por hospitais de todo o país".

De acordo com o médico e professor da PUC-Campinas Luciano Fuzzato, a principal diferença entre a bula da Leuginase e da asparaginase europeia, que era usada anteriormente no tratamento da doença, é que o documento do medicamento chinês é mais conciso e não cita nenhum estudo realizado em humanos. Já a bula do outro remédio exemplifica os testes realizados e os resultados de eficácia.

O especialista ainda informou que os principais problemas na bula do medicamento chinês, segundo ele, são alguns efeitos adversos que nunca foram verificados em nenhuma asparaginase, como sinais de psicose e a presença de tricomoníase, uma infecção causada por um parasita, que é mais comum em mulheres.



http://g1.globo.com/sp/campinas-regiao/noticia/centro-boldrini-faz-parceria-com-associacao-para-tratar-criancas-indigenas-com-cancer.ghtml
PIB:Roraima/Lavrado

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