Lideranças Pankararu sofrem ameaças e atentados na terra indígena; posseiros reafirmam que não sairão

Cimi - http://www.cimi.org.br - 04/10/2017
Depois que o segundo prazo, apenas em 2017, concedido pela Justiça Federal para a saída definitiva de 156 famílias de posseiros da Terra Indígena Pankararu se encerrou, no dia 28 de setembro, o uso de força policial se tornou uma possibilidade concreta. Não é coincidência que a temperatura tenha aumentado na região desde a semana passada. Se por um lado ameaças e atentados contra os indígenas passaram a ocorrer com mais frequência, por outro as lideranças dos posseiros dão notícias pouco animadoras para quem deseja uma saída pacífica para a situação. Na foto ao lado, ocupações consideradas de má-fé são desmontadas no interior da terra indígena.

Na sessão da Câmara dos Vereadores de Jatobá desta terça-feira, 4, uma das lideranças dos posseiros e presidente do Sindicato Rural, Eraldo de Souza, declarou que eles não saem da terra e que se a Polícia Federal retirar em um dia, os posseiros voltam no outro. Souza fez tal afirmação baseando-se no recurso impetrado contra a decisão da 38ª Vara Justiça Federal de Serra Talhada pela transferência dos posseiros para o reassentamento. Enquanto não houver uma definição sobre esta matéria, Souza garantiu que a decisão é por não sair. Outras 190 famílias já residem fora do território tradicional, mas mantêm propriedades nos 20% de área que os posseiros ocupam da terra indígena.

Enquanto isso as principais referências do povo Pankararu são alvos constantes de ameaças e atentados, vivendo sob a orientação de não saírem de suas residências. Três casos foram registrados na última semana; entre os episódios existe até a sabotagem de encanamentos públicos de água. O diálogo parece ter se esgotado, e resta uma decisão judicial a ser cumprida. No último dia 26 de setembro, uma nova audiência conciliatória foi convocada pela 38ª Vara Justiça Federal de Serra Talhada. Nela estavam lideranças indígenas e dos posseiros.

De acordo com os indígenas, o juiz Felipe Mota Pimentel de Oliveira reiterou que não voltará atrás nas decisões que tomou em fevereiro e agosto deste ano: os posseiros devem sair da terra Pankararu. No entanto, não definiu um novo prazo - o último estabelecido, em fevereiro, se encerrou justamente no mês de agosto, onde foi estendido até o final do mês passado. O juiz também se referiu a uma moção enviada pela Câmara de Jatobá. Segundo o juiz, o Legislativo não pode interferir no Judiciário. Para os Pankararu, a moção atiça os posseiros a não cumprir com a decisão judicial.

O vereador Jailton Pereira (PHS), mais conhecido como Neném do Hospital, autor do documento enviado à Justiça Federal, afirma que se tratou de uma Moção de Apelo e que ainda não obteve respostas do juiz. "Não estamos deixando de olhar pro direito indígena, cedo ou tarde os posseiros vão ter que desocupar. A terra é indígena, não resta dúvidas. A moção é pra gente ver se consegue sensibilizar a Justiça a utilizar de algum um instrumento para fazer o Incra realizar novo levantamento, atualizado no valor de mercado, para o projeto de reassentamento", explica o vereador.

Neném demonstrou uma preocupação inerente a outros vereadores quanto ao reassentamento dos posseiros: as eleições e o voto. Na última semana, ele esteve em Recife com o deputado estadual Rodrigo Novaes (PSD) e ambos participaram de audiência no Incra para solicitar que o reassentamento ocorra em Jatobá, não em outra cidade. "Falamos da importância de permanecer na cidade. Como vai ficar a situação eleitoral do município sem essas pessoas?". O vereador frisou que não pretende ferir os direitos indígenas, mas que a forma como os posseiros estão saindo é injusta. Negou ainda que vereadores Pankararu tenham sido hostilizados na audiência pública com posseiros, que culminou na Moção de Apelo, reafirmando que o clima foi de tranquilidade.

O Incra reservou 93 lotes para o Reassentamento Abreu e Lima, destinado a estas famílias. Conforme o órgão federal, os posseiros negaram em se transferir para o local, inclusive atrasando o cadastro das famílias que só ocorreu por determinação judicial. No total, a área possui 18.500 hectares - a TI Pankararu possui 8.100 - e fica no município de Tacaratu, vizinho do território indígena. A Funai, por sua vez, contabiliza em dados atualizados que está depositado em juízo, a título de indenização, R$ 6 milhões - mesmo nesta modalidade, o montante é beneficiado por juros. Tais garantias são frutos de um processo que corre desde 1993, tendo as avaliações de valores atualizadas, conforme a Funai, em 2013.


Ameaças, atentado e sabotagem


Um retrato do tamanho clima de tensão foi a ordem do juiz para que os Pankararu voltassem da Audiência Conciliatória para a terra indígena escoltados. Já era noite e logo a notícia correu: na aldeia Bem Querer de Baixo, um dos locais com mais concentração de posseiros, quatro homens sobre duas motos efetuaram disparos contra a casa de uma conhecida liderança - um dos projéteis atingiu a vidraça de uma janela. Dias antes, homens não identificados destruíram os canos da adutora que leva água para as aldeias. No dia 27 de setembro, uma liderança da aldeia Saco dos Barros foi ameaçada publicamente. A Polícia Federal tem ido aos locais e lavrado boletins de ocorrência. Algumas escolas indígenas e postos de saúde estão sem funcionar por precaução.

Tudo faz parecer que os posseiros não tiveram direitos garantidos e conforme os indígenas é isso que costumam espalhar pelos municípios do entorno. Para o procurador da Advocacia-Geral da União (AGU) Ricardo Ramos, que acompanha questões indígenas, e fica sediado em Recife, além do reassentamento e indenização, a tramitação do processo levou 24 anos. "Houve tempo hábil, os Pankararu nunca os expulsaram, a indenização atualizada está depositada e beneficiada por juros, o reassentamento é até maior que a área atual deles. É preciso observar que os direitos dos posseiros foram garantidos, chegou a vez dos indígenas terem os seus direitos preservados".

Ramos explica que poucas foram as avaliações de má-fé com relação ao caráter da ocupação de não-índios - reservadas apenas aos que se instalaram depois de 1994, data da primeira avaliação para se definir o valor das indenizações. "Dez ou 12 pegaram a indenização. Os demais se negaram porque suas lideranças passaram a defender que era insuficiente. Indenizamos até as fruteiras, o trabalho foi correto. Na minha avaliação poderia definir R$ 10 milhões que eles não sairiam", afirma Ramos.

A indignação entre os Pankararu só aumenta. "Toda essa situação tem acontecido pela ausência do Estado e fragilidade da Justiça em ter demorado todo este tempo, em processo que tramita desde 1993. Nesse período todinho os posseiros tinham ciência que estavam numa terra que não era deles. Não expulsamos ninguém, esperamos tudo o que era de direito deles garantido. E agora estamos em nossas residências acuados pelos posseiros. A briga aqui vem desde a década 1940, teve a homologação de 1987. Eles sabiam dessa situação", afirma uma liderança Pankararu.



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