Povos se unem para barrar invasores e lutar contra o fogo

Repórter Brasil - http://reporterbrasil.com.br/povodafloresta - 26/04/2018
Povos se unem para barrar invasores e lutar contra o fogo

Por Thais Lazzeri

"A ideia de que o Xingu é um paraíso, um local para ser preservado, é ótima. Mas o que a sociedade e os governantes fazem para manter esse paraíso?", questiona Kayatê Wareaiup, 41 anos da etnia Kawaiwete, também conhecidos por Kaiabi. Para ele não é possível falar sobre vida no Xingu sem falar de política. O seu povo é um dos 16 que habitam o que chamam de "ilha de floresta", também conhecido por Território Indígena do Xingu, que fica no Mato Grosso, o segundo estado no ranking do desmatamento do país e o campeão na produção de grãos.
Para se defender da pressão que os rodeia, os povos do Xingu se uniram e decidiram usar regra e termo criados pela política dos não-índios: o protocolo de consulta. Criado em 2016 como resultado da união dos povos que vivem nas quatro terras indígenas deste território, o documento estabeleceu diversas regras. A principal delas é que nenhuma obra ou medida que tenha consequências sobre o território possa ser tomada "sem nos ouvir e negociar honestamente com a gente".
O documento, referendado por 7 mil indígenas, já ajudou a barrar projetos de impacto, assim como a entrada de madeireiros, pescadores e outros invasores. Hoje, para entrar ali ou propor mudanças que afetem o território, é preciso passar pela Associação Terra Indígena do Xingu. "Aqui você não vê mais invasão, não vê mais caçador, madeireiro. Conseguimos porque essa briga não é de uma aldeia. Aqui não temos etnia. Essa briga é do Xingu inteiro."
Dos nove municípios que fazem fronteira com o território, quatro estão na lista dos dez maiores desmatadores do estado - Nova Ubiratã, Gaúcha do Norte, Querência e Feliz Natal -, segundo dados compilados pela Global Forest Watch a partir de informações da NASA e do Google, dentre outros. Lideranças do Xingu já foram às prefeituras e câmaras municipais tentar alertar e cobrar os políticos. "Não sou cientista nem pesquisador, mas valorizo o que vejo. No Xingu, as nascentes estão todas peladas [sem proteção das árvores]. A chuva que cai não vai para a terra, mas direto para o rio, deixando a terra seca."
Uma das consequências da falta de proteção das árvores do entorno, com o intenso desmatamento ao redor, é o aumento das queimadas. Levantamento do Instituto Socioambiental mostra que 66% das florestas ao redor do Território Indígena do Xingu foram desmatadas nas últimas três décadas. Com isso, os focos de calor tiveram aumento de 780%.
Picos de incêndio passaram a ser registrados em todo o Xingu. Em 2010, o fogo consumiu 250 mil hectares da reserva. Nos últimos dois anos, os picos bateram os 200 mil. Em resposta, os indígenas se dividiram em várias frentes de combate, alguns fizeram treinamento de brigadista. Hoje, quando as chamas se alastram na região, eles são acionados e se deslocam para apagar.
Dentro da aldeia, o fogo sempre foi elemento usado sob controle, presente em rituais e em atividades tradicionais importantes, como o roçado. Com a nova realidade, mesmo nesse contexto ele passou a oferecer perigo. Assim, os indígenas do Xingu foram obrigados a mudar as suas práticas para se proteger. Segundo Paulo Junqueira, coordenador adjunto do Programa Xingu do Instituto Socioambiental, uma das práticas que tiveram que mudar foi a tradicional queima do solo que depois será usado como roça. Os xinguanos reorganizaram o ritual milenar para evitar perder o controle das chamas.

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Bacia do Xingu

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