Governador do MS admite que saiu da PM bala que matou o indígena, e diz que já abriu inquérito
Miriam Leitão
23/09/2029
O governador de Mato Grosso do Sul, Eduardo Riedel, admitiu que o tiro que matou o indígena guarani-kaiowá Neri Guarani, durante uma ação policial no dia 18, partiu da Polícia Militar. A operação ocorreu na Terra Indígena Nhanderu Marangatu, em Antônio João, Mato Grosso do Sul. Ele alega que os indígenas estavam armados e a polícia revidou. Riedel está solicitando o apoio da Força Nacional para que esta assuma o policiamento da região.
O governador também confirmou que Luana Ruiz, advogada responsável pela ação judicial que determinou o uso da PM em defesa da Fazenda Barra, que se sobrepõe à terra indígena já demarcada, trabalha como assessora na Casa Civil do governo do estado. Ela é filha dos donos da Fazenda Barra.
- Há indígenas também atuando no gabinete e todos trabalham em prol de uma busca de solução - disse o governador.
Riedel participava ontem da mesa de conciliação do STF sobre a questão indígena, representando os 27 governadores do Fórum de Governadores, e falou com o blog.
Como está a reunião no STF?
Hoje é o dia dos especialistas. Acabaram de falar o Nelson Jobim, o Aldo Rebelo, o Eugênio Aragão, que foi ministro, o Eloy Terena. Eu conheço a questão indígena há 30 anos no Mato Grosso do Sul sem efetivamente conseguir concretizar algo. O relatório do CNJ de 2013 talvez tenha sido a maior aproximação de uma solução e que, por detalhes, de interesse de produtores, de algumas representações indígenas e do governo federal na época, não foi levado adiante. Acho que estamos num momento hoje muito perto de uma solução, mas muito perto mesmo. Eu acredito.
De uma solução para toda a questão ou só para Antônio João?
Acho que a partir de seis territórios que a gente chama de grau de litígio 1, que envolve o status jurídico, a segurança jurídica de ambos os lados, quer dizer, o território que já está demarcado, praticamente homologado, que é o caso de Antônio João, o caso de Douradina.
No caso da área indígena dos Terena e Miranda, Cachoeirinha, que é o nome da terra indígena. Há seis territórios que estão muito maduros, são os mais antigos e a gente, junto com o STF e todo o aparato jurídico do Governo Federal, está chamando de grau de litígio 1. A gente está buscando e encaminhando uma solução para essas áreas.
A partir do momento que os direitos constitucionais estão colocados, quer dizer, um título de boa-fé dado pelo governo federal, muitas vezes centenários. E com toda a busca das evidências antropológicas, se configura como território indígena, são duas linhas que são preservadas pela Constituição. O conflito é muito em função disso. Territórios hoje de pequenos e médios produtores, na maioria deles, há de ambos os lados uma consequência social muito grande de fazer ou de não fazer.
Nesse caso de Antônio João, o problema é a Fazenda Barra. E a advogada e filha dos donos, Luana Ruiz, trabalha no gabinete civil. O senhor não acha que isso tem um conflito de interesses bem gritante?
A Fazenda Barra era uma terra, se não me engano, de mil e poucos hectares. Lá são 12 ou 13 proprietários. Todos os outros já saíram das propriedades. São três irmãos da mesma família. Dos doze, outros nove não tem nada a ver com a família, são outros produtores.
Mas ela é autora da ação que levou a polícia militar para o território. É advogada, e ela é parte interessada porque ela é filha do dono. Ela trabalha no gabinete civil, é esse que é o conflito de interesses.
Tenho indígenas que trabalham lá também. Todos trabalham em prol de uma busca de solução ao longo de uma história de vida. A mãe e o pai dela estão lá na fazenda e dispostos a morrer e não querem sair. O Estado vai cumprir decisão judicial, e foi uma decisão judicial federal, ratificada, inclusive, pelo TRF3.
O que a defensoria fala é que o senhor mobilizou um volume grande de recursos. Eu queria saber quantos efetivos o senhor mandou para lá e quanto custou essa operação.
Quanto custou eu posso levantar. Sempre teve um efetivo, até porque a Força Nacional não está lá. E sempre por decisão judicial, há mais de um ano o efetivo permanece andando na região. E é muito clara a decisão, manter a ordem. O casal está lá na propriedade. Com toda essa discussão que reacendeu agora, depois de Douradina, nesses últimos 40 dias, houve aí sim uma ação mais contundente de grupos, ali das aldeias em volta, para retomar a Fazenda Barra.
Há dez dias, houve o primeiro conflito mais contundente. Eles queimaram uma ponte que é a única ponte de acesso que tem. O grupo policial junto com esse casal ficaram isolados sem acesso, porque lá é uma estrada interna com uma ponte que chega na fazenda e não tem pra onde sair na fazenda. Atrás da fazenda estão o Rio Estrela e o Paraguai. O território indígena fica bem na divisa do Paraguai. Aí foi chamado o reforço que reconstruiu a ponte e chegou o Choque porque eram 200, 300 ameaçando.
Quem atirou no indígena que morreu? Foi a polícia?
Foi a polícia. Foi a polícia que atirou, revidando. E no conflito anterior foi tiro de borracha. Enfim, houve a troca de tiro e foi a polícia. Abri inquérito, está sendo investigado, está tendo a discussão. E é a última coisa que a gente quer nesses conflitos. Lamentamos profundamente esse tipo de situação. É quase como a crônica de uma situação anunciada. Estou conversando com o ministro para ver se a Força Nacional assume, porque a família vai ficar. Agora, é muito ruim para a gente assumir esse papel dentro de um barril de pólvora que está naquela região.
Algo que eu tenho visto muita discussão é a influência do narcotráfico. As plantações de maconha, onde muitos trabalham, do lado do Paraguai, estão a 3, 4 quilômetros dali. Vai a pé, vem a pé, a gente entregou esse relatório.
Quanto efetivo mobilizou ao todo para ir lá?
Foram na faixa de 70, 80 policiais. Eram três guarnições, 12 homens da Polícia Militar (os que ficaram isolados). Depois foi o reforço do Choque, com mais uns 50, 60 homens, quando, de fato, explodiu o conflito. Agora eu não sei quanto custou a operação, aí tem que levantar. Foram três dias dessa operação lá. Não tem diária porque eles estão na função deles.
O senhor tem esperança de resolver esse problema?
Já vi as soluções perto e não ocorreram, então eu não gosto de fazer um prognóstico muito afirmativo diante da complexidade da situação. Eu acho que a gente está com um excelente caminho construído para se resolver. E aí falando da questão um pouco mais macro. Antônio João especificamente, nós estamos pedindo o apoio da Força Nacional até para que eles assumam. O que vai acontecer lá com a Força Nacional é outra história, mas a responsabilidade está com eles.
O senhor disse que foi a polícia que atirou. O que será feito?
Já foi aberto inquérito. A Polícia Federal esteve lá, retornou, não ficou lá e todos os procedimentos foram encaminhados. O indígena foi enterrado lá na aldeia, já depois do IML ter feito a avaliação. O inquérito está aberto, levantando todas essas situações.
https://oglobo.globo.com/blogs/miriam-leitao/post/2024/09/governador-do-ms-admite-que-saiu-da-pm-bala-que-matou-o-indigena-e-diz-que-ja-abriu-inquerito.ghtml
PIB:Mato Grosso do Sul
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