Indígenas guarani em SP celebram avanço na demarcação, mas temem morosidade de Lula para homologar territórios
'Enquanto a demarcação definitiva do território Jaraguá não sair, nós nunca vamos parar de lutar', diz cacique
Pedro Stropasolas
Brasil de Fato | São Paulo (SP) | 07 de novembro de 2024 às 07:48
No fim de outubro, o Governo Federal reconheceu sete territórios indígenas no estado de São Paulo após reunião com representantes dos povos Guarani Mbya, Nhandeva e Tupi Guarani.
Dentre as sete terras que tiveram portarias declaratórias assinadas pelo ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, está a Terra Indígena Jaraguá. Hoje, a TI é a menor do país, com 1,7 hectares, área menor do que dois campos de futebol. A demarcação definitiva do território irá garantir a ampliação da Terra Indígena para 532 hectares, uma luta que vem de décadas.
O processo aguarda agora a demarcação física da área por parte da Funai, a desintrusão dos não indígenas do território e a homologação definitiva pela Presidência da República. A última etapa é o registro na Secretaria de Patrimônio da União (SPU) e nos conselhos de imóveis.
O Brasil de Fato visitou a aldeia Yvy Porã para entender como os indígenas receberam o anúncio de Lewandowski. Ali, apesar de celebrarem o avanço, eles contam que a luta agora se volta para a homologação do território.
"Enquanto a demarcação definitiva do território Jaraguá não sair, nós nunca vamos parar de lutar", sintetizou o cacique Karai Márcio Verá Mirim.
E completou: "É uma garantia muito grande essa portaria declaratória que acabou de ser assinada, para que o nosso povo permaneça no território onde nasceu, onde a gente sempre viveu e também nessa prática da vida tradicional do nosso povo Guarani, para a gente perpetuar a nossa cultura, para a gente perpetuar nossas tradições".
Os benefícios da demarcação
Localizada a 27 quilômetros do centro da cidade de São Paulo, a TI contempla 7 aldeias. Ali, os indígenas sofrem com a presença de invasores e direitos básicos são historicamente negligenciados, como o acesso a serviços de saúde. O cacique explica o que pode ser construído a partir da demarcação definitiva
'A gente visa alcançar projetos de estruturação do território, de moradia, de soberania alimentar, onde a gente possa plantar o nosso próprio alimento", conta.
Jurandir Jekupe atua na frente de reflorestamento do território na aldeia Yvy Porã e descreve como a decisão impacta na preservação da floresta e dos costumes guarani.
"A demarcação é importante justamente para a gente poder fazer com que as nossas vidas sejam mais voltadas para a nossa cultura, possibilitar também de fazer coisas que fazem parte da nossa tradicionalidade, que é plantar, que é fazer artesanato, tirar remédios da mata, que é muito importante, e isso só acontece quando o território é demarcado, porque quando não é demarcado, a gente tem restrições que nos dificultam a fazer essas práticas da nossa cultura", explica Jurandir.
A TI Jaraguá teve sua portaria publicada em 2015, depois anulada em 2017 pelo então ministro da Justiça do governo Temer, Torquato Jardim. Essa anulação foi revogada pelo atual ministro da pasta, Lewandowski.
"É uma etapa muito importante, mas a gente quer essa garantia, principalmente para a nova geração. A gente tem essa preocupação que, mudando o governo, isso vire novamente um processo longo dessa terra indígena. Então, o nosso receio é isso, que retarde o nosso processo demarcatório, tendo em vista que é o primeiro passo da demarcação da terra indígena. E a gente tem essa preocupação de paralisar a demarcação", explica o líder Karai Márcio Verá Mirim.
Lucas Tupã Ruvixa é chefe da Brigada Florestal Indígena que atua na TI. A decisão, segundo ele, irá auxiliar os indígenas a conter os invasores e o avanço da especulação imobiliária. A brigada, além de combater os incêndios, ajuda no monitoramento do território.
"A importância para nós é muito grande. É uma vitória muito grande porque precisamos da área para sobreviver. As pessoas não vão poder mais chegar e adentrar na mata. Destruir a mata para fazer construção, invasão, essas coisas, porque já faz parte do território indígena", celebra Ruvixa.
Outras terras guarani
O ministro Lewandowski voltou a movimentar processos de demarcação de terras indígenas após seis anos sem nenhuma portaria declaratória. Mas segundo o Conselho Indigenista Missionário (CIMI), a quantidade de terras que seguem represadas nesta etapa do processo demarcatório ainda é alta: ao menos 40 terras indígenas aguardam a emissão de portaria declaratória, 18 delas sem impedimento jurídico.
O povo Guarani ainda aguarda a declaração de três terras indígenas por parte do Ministério da Justiça. Dentre elas, as TIs Ka´aguy Mirim e Boa Vista Sertão do Promirim, no estado de São Paulo, e Sambaqui, no Paraná. Há ainda outras quatro que estão prontas para serem homologadas pelo presidente Lula.
Uma carta assinada pelas lideranças presentes foi entregue a Lewandowski alertando sobre a necessidade do avanço na demarcação. Segundo um levantamento produzido pela Comissão Guarani Yvyrupa (CGY), além das três terras guarani que aguardam providência do MJ, há ainda outras quatro que estão prontas para serem homologadas pelo presidente Lula.
A APIB também celebrou o avanço na demarcação das sete terras guarani, mas ponderou a necessidade de demarcação das mais de 200 terras que ainda aguardam a continuidade dos processos. Até o momento, o terceiro governo Lula homologou 12 terras indígenas e assinou outras 11 portarias declaratórias.
"Nosso ar puro, o nosso território, a nossa vida depende da demarcação das terras indígenas. Hoje, as sete terras que estão tendo a sua posse declarada garantem uma parcela disso, mas ainda existem vários outros territórios que necessitam desse passo para que a gente mantenha a nossa cultura viva tradicionalmente dentro do nosso território", lembrou Saulo Guarani, da TI Amba Porã, na cerimônia em Brasília.
Edição: Nathallia Fonseca
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PIB:Sul
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