Ser uma mulher em um país com a quinta maior taxa de feminicídio no mundo é um grande desafio. Mas, para as mulheres indígenas e de comunidades tradicionais brasileiras, é ainda pior.
Em novembro do ano passado, estivemos em 5 regiões do Amapá que serão afetadas caso a licença de exploração de petróleo na região da Foz do Amazonas seja liberada pelo Ibama. A exploração de petróleo nesta área apresenta riscos graves de contaminação por derramamento de óleo e poluição química, que podem comprometer ecossistemas críticos. A atividade de perfuração também pode alterar as correntes marinhas e a qualidade da água, prejudicando diretamente a fauna marinha e as comunidades costeiras que dependem da pesca para sua subsistência.
Essas mulheres comunitárias, que já sofrem as consequências da crise climática e habitam regiões que não possuem saneamento básico ou coleta de lixo, vivem e adaptam suas vidas a contextos de vulnerabilidade.
Na comunidade ribeirinha de Arraiol do Bailique, Amapá, mais de 3.500 mulheres vivem sem acesso à água potável e sofrem com a salinização das águas do rio, que vem impedindo-as de plantar frutas e verduras em suas terras, além de mudar toda a dinâmica das águas e os pescados da região.
"Com a água salgada muda os peixes, muda o jeito de pescar, muda muita coisa, porque até o tipo de peixe que estávamos acostumados a pegar vai mudando, hoje a gente não consegue quase nada." - Joselene Ferreira, comunitária do Arraiol do Bailique.
A água potável é escassa, e nos últimos meses, apenas 1 galão de 20 litros de água por família foi disponibilizado.
Um estudo realizado com 139 mulheres quilombolas de oito comunidades do Rio Trombetas, em Oriximiná (PA), mostrou um cenário de vulnerabilidade crítica na saúde. Nenhuma das comunidades possuía uma Unidade Básica de Saúde (UBS) e, sem acesso regular a serviços médicos, 58% das mulheres recorriam a remédios caseiros, enquanto apenas 5,0% utilizavam farmácias.
Outro fator crítico é o impacto da mineração na saúde das quilombolas. A poluição do Rio Trombetas e do Igarapé Água Fria é associada a problemas de pele e respiratórios. A falta de serviços de saúde e os impactos ambientais da mineração expõem as mulheres quilombolas a condições que agravam sua vulnerabilidade, dificultando o diagnóstico e o tratamento de doenças e reforçando desigualdades na região.
A falta de acesso à saúde básica e as consequências do garimpo ilegal
A crise na saúde das mulheres indígenas é um reflexo de negligência e da ação destrutiva do garimpo ilegal. Estudos da Fiocruz revelam dados alarmantes: cerca de 50% das mulheres indígenas sofrem de anemia grave, chegando a 66% na Região Norte.
A mortalidade por câncer de colo de útero é 80% maior entre elas do que em outras populações de baixa renda, resultado da falta de acesso a exames preventivos e tratamento adequado.
O garimpo ilegal avança impiedosamente sobre as Terras Indígenas, destruindo territórios e envenenando corpos. Desde 2023, monitoramentos do Greenpeace Brasil indicam que quase seis mil campos de futebol de floresta foram devastados pelo garimpo nas TIs Kayapó, Yanomami e Munduruku.
O impacto é devastador: contaminação por mercúrio, aumento da violência e destruição dos modos de vida ancestrais. Pesquisas da Fiocruz mostram que mulheres e crianças são as mais afetadas pela contaminação: em aldeias do Tapajós, níveis de mercúrio foram encontrados até duas vezes acima do limite seguro da OMS. Entre as mulheres Yanomami, 40,2% apresentaram danos cognitivos graves devido à exposição ao metal pesado.
Na Terra Indígena Yanomami, mulheres como Ehuana Yaira, se mobilizam para proteger seus territórios da contaminação por mercúrio, exigindo o fim do garimpo e a responsabilização dos culpados. As Munduruku, aqui lembradas na figura das lideranças Alessandra Korap e Maria Leusa, seguem fortalecendo suas comunidades através da educação e do ativismo contra a liberação de mineração em Terras Indígenas, garantindo que seus saberes ancestrais e seus territórios não sejam dizimados.
"A gente é uma sementinha, que cresce cada vez mais. Nós somos um projeto de vida, de caciques e de mulheres que querem construir o futuro para seus filhos junto com a floresta e os animais" - Alessandra Korap Munduruku
Neste Dia Internacional de Luta da Mulher, temos um chamado à ação: solidariedade com as mulheres indígenas e comunitárias se demonstra na defesa de seus territórios, no apoio às suas lutas e vozes. Mais do que nunca, é tempo de somar forças e exigir justiça para aquelas que seguram o céu, sustentam a vida e resistem há séculos contra a destruição da terra.
A história de resistência dessas mulheres indígenas se conecta à trajetória de Eunice Paiva, conhecida internacionalmente através do filme Ainda Estou Aqui. Assim como as mulheres indígenas que seguem firmes em seus territórios, enfrentando ameaças diárias e lutando por seus direitos, Eunice transformou a dor de uma perda na ditadura militar, em força para lutar pelos direitos humanos e defender os povos indígenas.
Sua luta como advogada e indigenista reflete a coragem das mulheres que, em meio à violência e ao descaso, seguem resistindo para garantir um futuro digno para as próximas gerações. Como Eunice, essas mulheres mostram que resistir é um ato de amor, coragem e revolução.
https://www.greenpeace.org/brasil/blog/elas-ainda-estao-aqui/
Índios:Direitos Indígenas
Áreas Protegidas Relacionadas
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