Na Audiência Pública que tratará da Exploração de Calcário Biogênico de Algas Calcária em Santa Cruz no Estado do Espírito Santo, realizada dia 15/08/01, em Brasília/DF.
Autoridades Presentes
Senhores e Senhoras
Nessa minha fala procurarei enfocar a questão relativa ao tema específico desta Audiência Pública que trata da discussão sobre o projeto de exploração de calcário coralíneo que está sendo solicitado pela empresa Thotham Industrial Ltda.
Convidado para participar dessa Audiência Pública apresento algumas informações e procedimentos adotados pela Funai no encaminhamento da solução do problema em foco.
Para situar o problema dentro da ótica própria da FUNAI cabe apontar os seguintes fatos:
1. A área de interesse para exploração mineral do calcário coralíneo objeto dos alvarás de pesquisa 5.580/99 e 5.581/99 em nome da Thotham Mineração Ltda fica situada na plataforma continental em área de entorno da Terra Indígena Caieiras Velhas, habitada por índios Tupiniquim e Guarani Mbiá. Dentro dos planos da empresa está a pretensão em utilizar um trecho de 5 Ha em terra firme dentro da área maior de 50,57 Ha denominada "Área da Gamboa", para algumas instalações industriais.
2. Esse trecho de terra é reconhecidamente "território de ocupação indígena" e atualmente faz parte da Reserva Ecológica dos Manguezais Piraquê-Mirim e Piraquê-Açu (Lei Municipal no 994 , de 16 de Julho de 1986). A manutenção desse trecho fora da terra indígena deveu-se à existência de uma estação de tratamento de esgotos, o que levou as lideranças indígenas a propor um acordo com o antigo Prefeito do Município de Aracruz para a utilização da área apenas como área de proteção ambiental. Esse acordo começou a ser ameaçado no momento em que houve (de forma ainda não explicada) a doação de um trecho de área da Gamboa por parte do atual Prefeito de Aracruz para a utilização do empreendimento da Thotham através do Decreto no 8.851/99.
3. O ato da legalidade desta "doação" do terreno de 5,0 Ha foi questionado na Vara da Justiça Federal de Vitória/ES, através da proposição de uma Ação Civil Pública impetrada pela Organização Consciência Ambiental - ORCA, no dia 24.04.2000. A ORCA obteve uma liminar favorável e após isto a Thothan promoveu outro recurso.
4. Os índios Tupiniquim, em razão da quebra de acordo por parte da preifeitura de Aracruz, resolveram então ocupar a Área da Gamboa, reivindicando-a como terra tradicional de ocupação indígena. A reação dos índios, entretanto, não foi isolada. Inúmeros outros segmentos da sociedade civil se mobilizaram contra o empreendimento, como as associações de pescadores, ambientalistas do Estado e grande parte da população local.
5. A FUNAI enviou em caráter emergencial no início de outubro de 2000 um de seus técnicos (geólogo) à Terra Indígena Caieiras Velha/ES, para estudar os possíveis impactos ambientais do empreendimento. O relatório emergencial da Funai confirmou a possibilidade de ocorrência de possíveis impactos ambientais do empreendimento mineral que poderiam afetar a população daquela terra indígena.
6. No mês de novembro de 2000, atendendo reivindicação dos índios Tupiniquim, a Funai constituiu o GT 1156/00 para revisão dos limites da Terra Indígena sob a Coordenação da Antropóloga Maria Elizabeth Brea Monteiro tendo a participação também do Geólogo Múcio Nobre da Costa Ribeiro, ambos do quadro de Funai. Este Grupo de Trabalho realizou no mês de dezembro, os estudos técnicos e antropológicos para a possível incorporação dessa área contígua de 50,57 ao território indígena.
7. O relatório dos técnicos confirmou que a área em litígio é território indígena nos termos do artigo 231 da Constituição Federal e que necessitava ser declarado como Terra Indígena para a proteção dos direitos indígenas. Ao mesmo tempo, o relatório final do GT apontou que a Terra Indígena Caieiras Velha além do futuro processo de impacto ambiental que poderia sofrer com as atividades da Thotham, sofria mais 4 (quatro) processos de impactos ambientais decorrentes das atividades de:
PROCESSO 1 - Extenso plantio da monocultura de eucalipto.
PROCESSO 2- Tubulação de rede de esgotos sanitários do Serviço Autônomo de Águas e Esgotos - SAAE/FNS/MS, situado a SE da Terra Indígena.
PROCESSO 3 - Tubulação de gasoduto da Petrobrás que atravessa trecho sudeste da Terra Indígena; e
PROCESSO 4 - Obras de asfaltamento de estrada municipal que atravessa a Terra Indígena no sentido aproximado SE-NW na sua maior extensão territorial.
8. Tendo como base a pequena extensão territorial de Caieiras Velha e a necessidade de proteção dos seus recursos naturais, a Funai considerou que a promoção de mais um impacto com conseqüências imprevisíveis, poderia comprometer o futuro das gerações dos índios envolvidos.
9. Essa pretendida exploração pela empresa Thotham do calcário coralíneo ou sedimento biodedrítico marinho (SBM) ou sedimento bioclástico ou calcário biogênico (diferentes nomes do material a ser explorado que surgem nos documentos em estudo) gerou uma profícua discussão técnica-científica entre diferentes especialistas das áreas de recursos naturais. Diversos cientistas de notório saber como a Dra Maria Júlia da Costa Belém, Dr Roberto Sforza, Dra Jaqueline Albino e o Biólogo André Ruschi, emitiram pareceres técnicos sobre o tema em questão e foram unânimes em confirmar a inviabilidade técnica e ambiental do empreendimento da Thotham.
10. Durante a Audiência Pública promovida pelo IBAMA no dia 04.07.2001 que foi realizada em Santa Cruz/ES, a empresa não soube explicar detalhes da exploração mineral e deixou evidente a insuficiência das medidas preventivas ou mitigadoras da exploração mineral na plataforma continental. Quanto ao componente indígena, ficou também evidenciada a não observância dos aspectos sociais e ambientais que podem ser afetados pelo empreendimento.
11. Um dos pontos falhos do Relatório de Avaliação Ambiental AIA, apresentados pela empresa Thotham é a não citação das medidas legais a serem observadas em função do Decreto 1.141, de 19 de maio de 1994, que trata das ações de proteção ambiental junto às comunidades indígenas que sofrem interferência de processos impactantes ao meio ambiente.
12. Assim sendo, com base na legislação citada e em sua competência no âmbito do Governo Federal para a anuência de empreendimentos provavelmente impactantes de Terras Indígenas, a Funai encaminhou um pedido formal ao Departamento Nacional da Produção Mineral, através do Ofício PRES/306, para que não emita qualquer Guia de Utilização com o fim de lavra experimental, para exploração de calcário coralíneo na orla de Santa Cruz/ES, enquanto as dúvidas técnicas não forem resolvidas e os necessários procedimentos de cautela sejam tomados pelos Órgãos federais responsáveis pela preservação ambiental e pela exploração racional dos recursos naturais.
Desta forma, Senhores Parlamentares e demais autoridades presentes, a Fundação Nacional do Índio, já tendo publicado o seu relatório final no dia 04.07.2001, que reconhece a área em questão como sendo um território indígena, mantém a sua posição definida de preservar os direitos indígenas e será contrária a qualquer atividade industrial que possa comprometer a qualidade de vida dos índios Tupiniquim e dos Guarani-Mbiá no Estado do Espírito Santo.
Obrigado pela oportunidade.
Glenio da Costa Alvarez
Presidente da FUNAI
PIB:Leste
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