Celebração Índios invadiram Forte do Castelo, mas não foi para fazer guerra e sim para comemorar
A 4ª Semana Estadual dos Povos Indígenas teve sua abertura oficial na noite de ontem e reuniu autoridades, lideranças indígenas, imprensa, artistas e curiosos da boa música no Forte do Castelo. Sob a regência do maestro Enaldo Oliveira, 70 músicos da Orquestra Sinfônica do Teatro da Paz fizeram uma leitura das músicas indígenas e dividiram o palco com 60 índios dos povos Tembé, Asurini e Kayapó, numa simbiose de erudição, identidade cultural e elementos da natureza. Também se apresentaram o coral Guarani e a cantora Liliane Xipaia, com interpretação do Hino Nacional Brasileiro. O evento celebrou a abertura do Circuito Cultural Nós Indígenas, um grande circuito de exposições de acervos indígenas, montado com a finalidade de oferecer ao público um panorama completo da cultura indígenas. Até o dia 25 de abril, rodas de conversa, mostra de filmes, exposições, oficinas, debates, mediação virtual nas escolas, conferência e atos políticos fazem parte da programação.
Criado pelo Governo do Estado, através do Comitê Intersetorial de Política Indigenista - que reúne órgãos públicos voltados para o trabalho com os povos indígenas -, Museu Paraense Emílio Goeldi, Fundação Nacional do Índio (Funai), Universidade Federal do Pará (UFPA) e Ministério da Educação, o evento dá visibilidade à cultura indígena no Pará, valorizando mais de 50 povos que habitam cerca de 25% do território estadual. Este ano, a programação vai pautar questões de interesse dos povos indígenas e ter como eixos temáticos: meio ambiente, sustentabilidade e produtividade; educação, cultura e tecnologias; saúde, segurança alimentar e habitação; justiça, cidadania, direitos humanos e assistência social. De forma descentralizada, vai abranger a cidade de Belém e diversas aldeias indígenas nos municípios de Tucuruí, Paraupebas, Alter-do-Chão/Santarém, São Félix do Xingu e Altamira.
De acordo com o líder indígena Almires, do povo Guarani, o objetivo é fortalecer o diálogo entre os povos indígenas e o poder público nas esferas estadual, federal e municipal. "É um espaço aberto para atender demandas antigas. Este evento ultrapassa tudo o que já foi pensado até hoje e tem um caráter fundamental. Se há 200 anos os índios tentavam entrar neste espaço do Forte, hoje nós estamos dentro dele, tendo a orquestra como companhia e ao lado de uma contrução erguida por escravos indígenas - a Igreja de Santo Alexandre - num passado marcado por muita violência. E a importância do evento está no fato de o índio sair do papel de coadjuvante e passar a ser protagonista da própria história. Estamos discutindo o nosso espaço, mostrando que somos muito mais do que cocar, colar e grafismo. Estamos lembrando nossa trajetória e mostrando a nossa importância para que o País tivesse o desenho, a cultura e a geopolítica que tem", se orgulha Almires. Segundo ele, esta será a primeira vez que uma administração estadual vai pisar oficialmente no chão de uma aldeia e que a iniciativa, ainda que tardia, deve ser ressaltada.
A governadora Ana Júlia Carepa se mostrou satisfeita com a inciativa e destacou a honra em tentar mudar a relação de tratamento com os povos. "Ninguém de fora descobriu o Brasil, pois os índios já estavam por aqui. Esta nova postura na relação com eles representa o contrário do conflito histórico que sempre existiu. Este evento reafirma políticas públicas e culturais que valorizam a história e o papel deles, começando pela sua manifestação musical", disse. Ana Júlia também falou dos programas de apoio aos povos indígenas, da inauguração dos seis pontos de cultura nas aldeias indígenas, do programa Navega Pará permitindo o acesso à internet até as regiões de fronteira com a Venezuela e sobre o filme Tainá 3, como exemplos de convivência, respeito e recomposição para com a floresta. A atriz Eunice Baía, que é descendente de índios e atuou nos filmes Tainá 1 e 2, disse "sentir-se parte integrante dessas misturas culturais", destacou a coragem de pessoas que se uniram para demonstrar esse sentimento através da música e teve as palavras endossadas por Walmir Bispo, da Fundação Curro Velho.
Bosque Rodrigues Alves antecipa comemorações pelo Dia do Índio
Na véspera do Dia do Índio, que transcorre hoje, dois grupos de dança, o Ananin Dance, de Águas Brancas, Ananindeua, e o Encanto Marajoara, do bairro do Castanheira, apresentaram ontem de manhã, no Bosque Rodrigues Alves, números de dança baseados na cultura indígena, a qual constitui-se na referência para que os cidadãos nas cidades, ou seja, não indígenas, assimilem um modelo de convivência harmônica com seus semelhantes e com o meio ambiente, como destacaram os dançarinos e coordenadores desses projetos.
A exibição dos números de dança atraiu o público presente no Bosque, principalmente a criançada que se concentrou na área em frente à brinquedoteca, a fim de não perder nenhum detalhe do espetáculo intitulado "Encanto Ananin", com ritmos e lendas amazônicas, coordenados pelos coreógrafos Cleito Pantoja e Andréa Paixão.
"Nós aproveitamos a cultura indígena para trabalhar valores com os integrantes dos grupos, a prática dos indígenas de conviver em harmonia entre eles e com a natureza, o que consideramos fundamental nas relações entre os seres humanos", afirmou Cleito Pantoja. Há sete anos no grupo Encanto Marajoara", Rafaela Collins, 21 anos, enfatizou que a cultura indígena está presente no dia-a-dia dos paraenses e dos brasileiros em geral. "O índio está presente no nosso cotidiano, na nossa comida, nas estampas que a gente usa, nas bujeterias, ele é um símbolo da nossa região", afirmou. Os grupos Encanto Marajoara e o Ananin Dance atuam no resgate de jovens em situação de risco na Grande Belém por meio da arte da dança.
Rodrigo Peres, 18 anos, quatro dos quais quatro no grupo Ananin Dance, enfatizou: "A cultura indígena é por demais importante para todos nós, da Amazônia e do Brasil, porque elas nos fala da nossa origem e da nossa história como brasileiros". No Bosque Rodrigues Alves, o público pode conferir uma exposição com 50 peças indígenas, organizada pela Fundação Nacional do Índio (Funai) no Chalé de Ferro. No local, podem ser observados um cocar de bambu, cerâmicas, cestaria, arte plumária, instrumentos musicais, utensílios de culinária, um pente que também serve como enfeite, colares.
Museu Emílio Goeldi faz semana voltada ao conhecimento indígena
O Museu Emílio Goeldi deu início ontem à sua programação em homenagem ao Dia do Índio, comemorado hoje. As atividades incluíram oficina de arte e plumária, para ensinar às crianças as técnicas que os índios utilizavam na confecção de seus adornos, como os cocares; atelier de pintura; Carro da Leitura, com livros voltados exclusivamente à cultura dos grandes homenageados; e o "Programa Natureza", espetáculo com a narração de lendas, brincadeiras, gincanas e distribuição de brindes. A programação se encerra na próxima sexta-feira, 23, com palestra sobre a cultura indígena ministrada por Ruben Tavares Souza. Quem for ao Museu poderá ainda visitar a exposição "Caiapó", inaugurada na última sexta-feira, 16.
Segundo Edileuza Sodré, técnica do Serviço de Educação e Extensão Cultural (Sec) do Museu Emílio Goeldi, todos os anos a instituição realiza atividades em homenagem à data. "O objetivo é conscientizar às crianças para a importância do índio na nossa cultura", justifica.
Durante as apresentações do "Programa Natureza", o técnico Alcemir Aires interpreta o Macaco Ximbica, que interage com as crianças e conta as principais lendas indígenas, como a da "Cobra Grande". "Queremos levar essa cultura indígena que está sendo esquecida às pessoas", reforça o técnico do Museu. "A gente fala em Dia de Índio, mas todo o dia é dia deles. A gente ainda usa algumas coisas que vieram dos índios. Quem não gosta de se embalar na rede, por exemplo?", questiona Alcemir Aires.
O bombeiro Plínio Marcus, de 38 anos, levou o filho, Tiago, de seis anos, para conhecer as principais atrações do Museu Goeldi e aprovou a programação voltada ao Dia do Índio. "Ajuda a valorizar a cultura, mostrando para a sociedade as características de cada povo", acredita. Para ele, eventos deste tipo ajudam, ainda, a estimular a imaginação das crianças. "Principalmente porque a história leva muito às salas de aula da cultura africana, dos negros. E a dos índios também precisa ser valorizada, principalmente aqui no Pará", acredita Plínio Marcus.
Tribos reclamam de promessas não cumpridas pelos governos
O Dia Nacional do Índio, comemorado hoje, traz questões que precisam ser discutidas pela sociedade. Há índios que reclamam da falta de atendimento na área da saúde e educação. Outros acreditam que as melhorias vão ocorrer. Algumas questões foram respondidas pelos mais interessados nelas - os próprios índios. Segundo o cacique Sérgio Muritti da aldeia Tekohaw, localizada no município de Paragominas, sudeste paraense, a vida dos indígenas é difícil. Ele conta que tudo que é prometido não passa dos papéis e nada chega até eles. "As autoridades se esqueceram de todos nós. Estamos abandonados a própria sorte sem condições de continuar sobrevivendo sem os recursos que deveriam ser fornecidos normalmente", afirma.
O cacique disse ainda que se preocupa com a falta de médicos para o atendimento. "Faz mais de cinco anos que os médicos não aparecem para nos examinar. Sei de pessoas que já morreram por doenças das quais o tratamento com um médico resolveria. Esta constatação é triste, porém inevitável", afirma.
Além da falta de médicos a educação na aldeia está deficitária. Sérgio disse que não há professores para lecionar aulas para o ensino médio há três anos. A estrutura das escolas é outro problema apontado por ele. "O local onde a escola funciona está caindo aos pedaços. Temos medo até de ficar por perto a casa pode cair. Além disso, a educação é de péssima qualidade em todos os sentidos. Os professores não dão aula direito", disse. Mais de 400 índios moram na aldeia que fica localizada próximo ao rio Gurupi em Paragominas.
Para Sérgio a educação é o fator principal para o desenvolvimento da aldeia. "Nós sabemos que se tivéssemos educação poderíamos lutar melhor por nossos direitos. Sabemos que esta é a base que precisamos", afirma. O apoio da Fundação Nacional do Índio (Funai) é essencial para Sérgio, mas ele acha que o órgão não está cumprindo com seus deveres. "A Funai deveria estar nos dando apoio e nos procurando para saber sobre os problemas pelos quais passamos diariamente. Ninguém se interessa por nós. Este não é um dia em que comemoramos. É dia de pedirmos ajuda a sociedade paraense para que se mobilizem", afirma.
A respeito da reclamação de indígenas da aldeia Tekohay, do município de Paragominas, sobre a falta de ensino médio e problemas estruturais na escola da aldeia, a Coordenação de Educação Indígena (Ceind) da Seduc informa que, de acordo com o cronograma estabelecido pela instituição, o ensino médio já foi implantado este ano na aldeia Cajueiro, naquele município e na segunda quinzena de maio será implantado na aldeia Tekohay. Quanto às condições da escola da aldeia, foram firmadas parcerias entre a comunidade e o município para a recuperação da escola. A Fundação Nacional de Saúde (Funasa) foi procurada e até o final desta edição não foi encontrada para responder as questões levantadas.
Já o cacique Valdecir Tembé diz que existem problemas, mas são pequenos e podem ser superados. "Acredito que com a nova estruturação que está ocorrendo vamos ficar em uma situação ainda melhor do que a que já estamos. Somos bem assistidos perante os órgãos competentes, apesar das pequenas falhas que, na minha opinião, são naturais, pois nada pode ser perfeito. Acredito que as melhorias vão acontecer, mas para isto todos precisam ter paciência", afirma acrescentando sua expectativa quando a implantação de uma base da Funai na aldeia.
O coordenador regional da Funai, Juscelino Bessa, diz que os problemas na aldeia são reais. Ele afirma que o orçamento destinado ao Estado do Pará é de apenas R$ 100 mil, insuficiente para administrar mais de três mil índios. "Realmente existem problemas referentes a estes índios, pois os recursos são pequenos para o número a assistência efetiva. Esperamos que a nova estruturação ajude no sentido de melhorar a vida de todos eles, pois este é o objetivo. No mês de março foi feito um concurso público para que mais pessoas possam trabalhar no órgão e desta forma viabilizar mais as visitas que hoje são feitas uma vez por mês com o efetivo de cerca de 150 funcionários", afirma.
Projetos estão na pauta de discussões para o futuro dos índios. O primeiro se refere a um projeto de reflorestamento das terras indígenas no alto rio Guamá que abrange os municípios de Nova Esperança do Piriá e Paragominas. O segundo diz repeito a Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação na mesma localidade. O terceiro projeto é feito em conjunto com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente (Semma).
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Índios:Semana dos Povos Indígenas
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