Pesquisadores e jovens começam atividades para produzir e publicar inventário cultural pataxó

Tribos Jovens - http://www.tribosjovens.org.br/ - 28/02/2011
Instituto Tribos Jovens realiza atividade para valorizar, registrar e tornar conhecidos os saberes e fazeres da cultura Pataxó

O Instituto Tribos Jovens realizou nos meses de janeiro e fevereiro uma pesquisa na Aldeia Pataxó de Barra Velha como parte da atividade "Levantamento dos Saberes e Fazeres Pataxó". Desde novembro de 2010, a antropóloga Bianca Arruda está coordenando com jovens pesquisadores Pataxó formados na Oficina Pesquisa Histórica e Cultural, e orientados pelo professor-historiador e doutorando Francisco Cancela, um trabalho de inventariar as principais manifestações culturais, tradições, rituais e memórias sociais. A investigação está sendo realizada em parceria com o grupo de pesquisa Pataxó Atxohã e Associação Pataxó de Ecoturismo de Aldeia Velha.

A atividade "Levantamento dos Saberes e Fazeres Pataxó" integra o Projeto "Promoção da Cultura Pataxó para o Etnodesenvolvimento", financiado pela Comunidade Européia e executado pelo Instituto Tribos Jovens. A atividade terá como produto final um documento com uma descrição analítica dos elementos próprios da cultura Pataxó, que será publicado e distribuído. A metodologia inclui pesquisas bibliográficas, trabalho de campo na Aldeia Barra Velha, oficinas para a formação de pesquisadores e assistentes e interpretação analítica dos dados para confecção do texto e produção do Inventário.

Segundo Francisco Cancela, orientador da pesquisa, a reconstrução da trajetória histórica de um povo, constitui uma das ferramentas mais importantes no movimento de afirmação da identidade étnica, de difusão da diversidade cultural e de construção de alternativas de desenvolvimento democrática e sustentável: "Por esse motivo, a pesquisa histórica compreende uma das atividades centrais no desenvolvimento do projeto Promoção da Cultura Pataxó para o Etnodesenvolvimento", afirma.

Para Cancela o inventário vai ainda possibilitar a sistematização e registro das experiências vividas pelos Pataxó nesses mais de 510 anos de história pós-contato com o europeu. Além disso, vai destacar como se deu o processo de conquista e colonização de seus territórios e como os indígenas formularam estratégias para garantir sua sobrevivência física e cultural em um cenário de dominação, exploração e subordinação. "Essa síntese será fundamental para auxiliar na inteligibilidade das transformações culturais vividas pelos índios Pataxó e para superar uma visão predominante na sociedade envolvente que considera a trajetória dos índios como uma narrativa fatalista de sua própria extinção," ressalta Cancela.

Em entrevista, a antropóloga Bianca Arruda e Ajurú Pataxó, membro Coordenação de Pesquisa da Língua e História Pataxó (ATXOHÃ) falam sobre o Inventário que está sendo realizado.

Bianca Arruda

P - Como será esse inventário? Por que fazer um inventário da cultura Pataxó?

R- O Inventário dos Saberes e Fazeres da Cultura Pataxó, que faz parte do projeto "Promoção da Cultura Pataxó para o Etnodesenvolvimento", será fruto de duas atividades: as pesquisas dos saberes e fazeres e da história dos índios Pataxó. Ele terá informações sobre a história e a cultura Pataxó, divulgando sua historicidade e patrimônio cultural. O objetivo será contribuir para melhor apropriação da cultura pelos próprios índios com a publicação de informações sobre as principais tradições, rituais, memórias etc. O Inventário também permitirá a disseminação da cultura indígena para os não-índios, revelando sua riqueza e contribuindo para a diminuição de preconceitos e a reprodução de estereótipos. De início, a pesquisa dos saberes e fazeres se concentrará nas aldeias de Barra Velha, Aldeia Velha e Coroa Vermelha, mas futuramente esperamos poder expandi-la para mais aldeias Pataxó.

Outro objetivo importante desse Inventário é a possibilidade de dar continuidade à formação de jovens pesquisadores indígenas. Ainda no âmbito do projeto, no segundo semestre desse ano, foram realizadas oficinas de Pesquisa Histórica e Cultural, com a participação especial de três anciões da Aldeia de Barra Velha. Participaram das atividades uma média de 40 jovens e as oficinas foram realizadas através da metodologia de pesquisa-ação, e de Laboratório Audiovisual e de Mobilização e Comunicação Social. Com a realização da pesquisa dos saberes e fazeres, três participantes serão contratados para trabalhar e poderão pôr em prática o que aprenderam nessas oficinas. Assim, eles terão a oportunidade de vivenciar uma experiência de atuação profissional que lhes abrirá alternativas de trabalho e renda, enquanto pesquisadores a atuarem na realidade que investigam.

P - Como delimitar o que é próprio da cultura pataxó?

R - Para delimitar o que é próprio da cultura Pataxó devemos, antes de tudo, reconhecer toda a história de contato, de luta e de invenção de alternativas de sobrevivência do povo Pataxó ao longo de, pelo menos, 510 anos, quando se deu o fatídico encontro desta população com os não-índios. Durante este período, além dos processos de extermínio, a expropriação do território e da cultura Pataxó foram experiências que ficaram muito mais evidentes na História. Contudo, existiram também processos de resistência e de elaboração de alternativas que possibilitaram a continuidade social, cultural e territorial dessa população. O desenvolvimento da pesquisa histórica que tem por objetivo evidenciar esses processos de resistência é um dos meios que temos para ajudar a delimitar o que é próprio dessa cultura.
Mas esse procedimento não só não basta para delimitar o que é próprio da cultura pataxó, como também pode ser algo perigoso: em primeiro lugar, devemos reconhecer que o que é próprio de uma cultura não se reduz ao que pode ser recuperado por meio de uma investigação histórica. A cultura é viva e, como tudo o que é vivo, ela escapa, transgride a esse tipo de investigação. O perigo de reduzirmos a cultura à dimensão da história vivida dos homens é justamente incorrermos num reducionismo histórico e utilizarmos a faceta mais pobre dessa ciência: objetivamos entender os homens de hoje à luz do que foram no passado. Assim, a História torna-se Teleologia.

Ajurú Pataxó

P - Qual a importância de um trabalho dessa natureza?

R- Na verdade esse inventário da cultura Pataxó é mais uma das formas de disseminar os saberes e fazeres Pataxó e aquilo que é único do nosso povo. Em outras palavras mostra a capacidade de valorizarmos e preservarmos tudo que pertence a nossa cultura. A construção desse inventário comprova a relevância da parceria entre instituições e comunidades indígenas formulando e aprovando projetos que visam à contribuição para o fortalecimento da unidade e cultura Pataxó. Tenho certeza que após a produção desse material, nos locais aonde iremos disseminá-lo, vamos ganhar novos aliados da cultura Pataxó. Este inventário surgiu em um momento muito oportuno, pois com isso vamos dar outro avanço no que diz respeito aos aspectos da nossa cultura: toda e qualquer produção e publicação que estejam relacionadas ao povo Pataxó é muito importante para as comunidades indígenas.

P - Quais as dificuldades encontradas na construção do inventário?

R- De uma maneira geral foi muito fácil, pois já somos parceiros do Instituto Tribos Jovens. Nós nos reunimos e propusemos a melhor forma de realizar a pesquisa junto com o grupo de pesquisa Atxohã. A nossa contrapartida consiste em auxiliar na realização da pesquisa de campo e da pesquisa de arquivo, compartilhar os materiais do acervo de pesquisa da Coordenação e elaborar juntamente com a equipe do ITJ a Oficina dos Saberes e Fazeres, já o Instituto, dá o suporte às atividades de campo desenvolvidas. A contrapartida também prevê os créditos pela publicação da pesquisa ao grupo Atxohã, ao Ponto de Cultura e a Escola Indígena de Coroa Vermelha, além de viabilizar a presença e o intercâmbio de integrantes dos Pontos de Cultura de Aldeia Velha e Coroa Vermelha nas atividades de pesquisa em Barra Velha. Outro objeto primordial para este trabalho foi a contratação de dois pesquisadores e um auxiliar de pesquisa Pataxó. Até porque a idéia desse inventário é parecida com a investigação que o Atxohã Pataxó vem desenvolvendo nas aldeias do Extremo Sul da Bahia.


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